terça-feira, 28 de dezembro de 2010

Não gosto do Natal, mas dos presentes

Então, foi Natal... E ainda vejo crianças negras, maltrapilhas, pseudo-sorridentes, com suas caixinhas forradas de papel cartolina, lançando-se sobre os vidros fumês dos carros à procura, muitas vezes encorajadas pelos pais, de uma nica, uma moeda qualquer, uma migalha de presente natalino. Dançam, realizam malabarismo, dramatizam, em rostos tristes forjados, a carência que lhes é habitual e rotineira.

Mas daqui a alguns dias vão desaparecer da mesma forma "mágica" com que apareceram aos montes nessas últimas horas de espírito cristão. E voltarão ao total esquecimento. A verdade é que até esse período, de elevação espiritual humana, transforma-se em evento, em oportunidade de capitalização. E, infelizmente, nossas crianças sabem disso, seus pais sabem disso, só a gente, da turma aqui do Natal, que ignora, ou finge não saber.

E aí tratamos de abrir nossos vidros fumês elétricos com a ponta dos nossos dedos, para com os mesmos depositarmos solidariamente e lamentosos duas ou três niquinhas de Real, seja naquela caixinha horrosa de cartolina, seja nas pequenas mãos sujas que nos tira o peso das costas até o próximo Natal. Como se houvesse um acordo social tácito de que a mercantilização da solidariedade devesse ser sazonal e a forma menos evidente para mascarar a condição egoísta do homem capitalista.

Eu, inclusive, já despejei alguns míseros centavos, dei um sorriso receptivo e recebi um "obrigado" formal e singelo de gratidão. Agora estou aqui escrevendo as baboseiras que provam minha tamanha e natural hipocrisia. Foi longe de centavos o que gastei para presentear pessoas queridas e mais próximas.  Na verdade, nunca gostei de Natal. Porque ele faz parecer que o altruísmo é um valor nosso, dos seres humanos. Porque ele consegue mascarar que a solidariedade humana é uma moeda de troca. 

Em raríssimas vezes, tal solidariedade não esconde ou um interesse material (ganhar um presente legal também) ou um pretensioso e suposto acerto de contas com nosso egoísmo e mesquinharia, sendo, assim, mais egoístas e mesquinhos que outrora, com o agravo de sermos, nesse momento, mais dissimulados.

Na verdade, eu nunca gostei de Natal. Porque ele me faz ver que não estamos nem aí  para os meninos pedintes nas sinaleiras. Eles nos agridem, incomodam, mas, por fim, concedem-nos penitência de pecados que nunca cometemos. "Feliz Natal" é tudo o que Capitalismo sempre quis desejar ao Cristianismo. A moral cristã é a mesma daquela capitalista. Ou melhor, a solidariedade sempre teve o seu preço e seu marketing.  É evento socioeconomico, nada mais. Tiremos dele a magia e a espiritualidade que nunca teve de direito.

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

O menino capoeira e o Estado assassino

O caso do menino capoeirista Joel Conceição Castro, 10, morto dentro de sua própria casa na noite do último domingo durante uma ação policial no bairro do Nordeste de Amaralina, escancara a insanidade de nossa sociedade.  O garoto, prodígio do grupo capoeira Gingado Baiano, saiu das cores suaves de sonho da propaganda institucional do governo, voltada para atrair turistas em torno da cultura afrodescendente baiana, direto para as cores duras da realidade da violência urbana, que ceifa a vida de jovens da nossa capital, em sua maioria esmagadora pobres e negros.

No enterro do pequeno capoeira, palavras brotaram como desabafos para além da justa revolta dos familiares, amigos e vizinhos de Joel. Mestres de capoeira, líderes comunitários e membros do movimento negro fizeram um chamamento à comunidade do Nordeste - válida para demais bairros populares onde vige o império da barbárie - de que é necessária uma luta política de inclusão dos espaços pobres dentro do Estado de Direito Democrático. 

Discursos como o do fundador do Movimento Atitude Quilombola no Nordeste de Amaralina, Wilson Queiroz, denotam uma consciência que transcende o recorte específico da tragédia: "Há um certo tipo de genocídio nas favelas.  Não temos mais a quem recorrer. Estamos morrendo no Nordeste, no Subúrbio, na Liberdade. O sistema fez a violência entrar em nossas casas. A capoeira tem poder. Está na Europa. Ela deve movimentar a Europa e a ONU (Organizações da Nações Unidas)", disse o líder comunitário.

As palavras muitas vezes soaram segregacionistas, pintando um quadro no qual brancos executam negros. Os afrodescendentes - 80% da população de Salvador e na maioria pobre - sem dúvida são as maiores vítimas da violência urbana, e por isso se faz compreensível o entendimento ali exposto - mas a sociedade, especialmente nos âmbitos brancos e elitistas, não deve entender a realidade por esse prisma, acentuando os contornos de um apartheid socioeconomico vigente, escondendo-se atrás da falsa prerrogativa de que tamanha violência não bate à porta ou não estraçalha à bala a janela do quarto do lar para em seguida esfacelar a cabeça do filho querido. 

Infelizmente, estamos nesse patamar, fazendo ouvidos surdos para o drama de milhares de Joeis periferia afora, vivendo a farsa de uma pseudo liberdade e escassa democracia. Ou poderíamos considerar livres cidadãos que estão submetidos a blitz policiais intensivas pelas ruas, todos a princípio suspeitos até que provem a inocência depois da auditoria do Estado vigilante? Ou somos ingênuos a ponto de acreditar que estamos assim protegidos, que podemos então lavar as mãos e esquecer? Ou não lembramos que o idoso Isnard Costa, 73, foi assassinado dentro de seu apartamento no mesmo último fatídico domingo, localizado no Corredor da Vitória? Ou não lembramos que o juiz Carlos Alessandro Pitágoras foi morto, em julho, numa briga de trânsito, pelo PM Daniel dos Santos Soares?

Uma sociedade que demanda um Estado violento e vigilante está doente. Pagamos uma polícia militar para certificar nossa inocência enquanto ela mata os inocentes de verdade.  A PM é nosso espelho, tão vítima e algoz quanto a sociedade que construímos e o Estado que legitimamos.

sábado, 23 de outubro de 2010

Luz aos acontecimentos, enfim

O Estado de São Paulo lançou um pouco de luz ao abismo em que o cidadão brasileiro vem caindo nesses dias de recorrentes trocas de acusações mútuas entre petistas e tucanos e, mais grave, de um imenso bombardeio de matérias jornalísticas com versões partidárias, interesseiras e distorcidas. Estávamos à beira de uma república niilista, diante de uma histórica descrença pública nos políticos brasileiros, salvo raras exceções, e do descrédito total a uma imprensa de um lado golpista (Globo, Veja, Folha de S. Paulo) e de outro quase chapa branca (Istoé, Carta Capital, Record).

Tiro o Estado de São Paulo do bolo não por inclinações ao jornal, mas porque teve a coragem de divulgar o depoimento na íntegra do grande protagonista dessa sujeirada eleitoreira a que estamos submetidos nos últimos dias. Falo do jornalista Amauri Ribeiro Júnior. À Polícia Federal, ele de fato afirmou que investigava José Serra, em nome do jornal Estado de Minas, que pretendia proteger Aécio Neves das investidas investigativas do presidenciável tucano, cujo objetivo era produzir um dossiê contra o político mineiro a fim de pressioná-lo a desistir da sua candidatura à presidência.

Amauri Ribeiro também confirma que o material coletado das suas investigações apontam para o envovimento de José Serra nas operações suspeitas de privatização de estatais brasileiras na era FHC, inclusive da filha do tucano, Verônica Serra, através de contas em paraísos fiscais. Mas o PT também não é poupado. O jornalista aponta para uma briga interna dentro do partido, cujo epicentro de conflito seria o controle da comunicação da campanha de Dilma Roussef. Tal conflito teria gerado o vazamento dos dados sigilosos de familiares de Serra e outros tucanos à imprensa.

Veja aqui o depoimento na íntegra. 

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

A democracia mostrou seu fígado

Minha opinião diverge de todos os discursos moralistas e assépticos sobre esse momento da política brasileira. A campanha eleitoral em nível abaixo da linha de cintura, para usar um jargão do boxe, expõe nosso fígado, quando digo nosso, estou falando da democracia brasileira. E serve para assustar os mais crédulos desse nome que é igual a picolé na boca de criança, uma vez com ele não se quer mais largar. Também serve para alertar os mais céticos, de que o veneno de cobra pode funcinar, em doses controladas e certeiras.

Em meio a essa sujeirada toda, levada a cabo por petistas e tucanos, ficamos atentos que era preciso aprimorar os mecanismos de guarda dos dados sigilosos da Receita Federal. Embora já fosse notório o vão do sistema, a mídia só na eleição jogou o problema à esfera pública na dimensão que carecia, embora por caminhos tortuosos e distorcidos, balizados pela disputa eleitoreira e não pelos certames da segurança jurídica e fiscal dos brasileiros.

Pelos mesmos subterfúgios, e aí devam-se, em parte, os louros à imprensa tupiniquim, desmascarou-se a Erenice Guerra e seus tentáculos na Casa Civil e lembraram-se os esquemas de um certo Paulo Preto e suas relações com o candidato José Serra, servindo para tirar de exclusivos do lulopetismo os atos mais suspeitos e escandalosos. Isso é saudável ao processo político, não estou blefando. A politica em nenhum momento serviu-se do altruísmo para fazer valer suas premissas, por mais humanitárias e justificáveis se apresentassem. E a imagem pudica a qualquer político profissional não pode corresponder sempre, nem ajudar, a uma democracia em construção, como a nossa.  

Mas não bastassem tantos suplementos à robustez do poder de nosso povo, veio a "tsunami" ou seria "marola" do engajamento e poder religiosos, travestido da questão sobre o aborto. Pronto. Expusemos nosso fígado, jogamos ele para fora. A política está condicionada a um pathos. A nada mais brasileiros estão tão assujeitados que suas próprias convicções de fé, e, portanto, também religiosas. Resumindo, nossa política é pessoal, personalista e patológica. 

Daí porque a polêmica serviu para escancarar que a democracia brasileira é tão racional quanto a laicidade do entendimento do povo, ainda que seu Estado, por definição, seja laico. Se o povo reza, ora e pede a Deus, não há democracia agnóstica que inverta a ordem das coisas. E, lembro, a religiosidade é a maior questão politica do mundo hoje, bem sabe a dita maior democracia do Mundo, com seu presidente negro, suas vítimas de atentado terrorista,  sua expansão imperialista belicista e seus discuros intramuros raivosos, racistas, protestantes e ultraconservadores de plantão.   

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Marina oferece uma nova política para o Brasil

Marina destoa de tudo velho, para anunciar boas novas e trazer sangue renovado às veias viciadas e desgastadas da política brasileira. Seus quase 20 milhões de votos são uma expressão inequívoca de um novo anseio político vicejando nas entranhas da sociedade brasileira. Não é apenas mero fruto de um casuísmo político das atuais eleições, impulsionado por denúncias de tráfico de influência na Casa Civil, de posicionamentos polêmicos acerca do aborto atribuídos à candidata Dilma Roussef, nem de uma consequente adesão do público religioso à candidatura do PV, devido à religiosidade de Marina.  

É muito mais. Caso contrário, não seria ela a "roubar" os votos do PT, mas Serra. Caso contrário, cientistas políticos e jornalistas analíticos não estariam, por assim dizer, aconselhando petistas e tucanos a adotarem o programa e discurso ecosustentáveis em suas campanhas neste segundo turno. 

A minha empolgação sobre Marina tem razão de ser. Ela, felizmente, plantou um sentimento forte de que o Brasil pode voltar a ser um País altamente politizado, sobretudo sua juventude, e reverter um processo de despolitização ou burocratização do discurso político, recentemente limitado às burras arestas tecnocratas, gestacionais e administrativas. Ela deixou claro que é possível outra onda de mudança e projeto políticos, assim como fez Lula de 1989 até o ano que foi eleito em 2002. Marina teve grande votação na classe C - a nova classe média - e entre os universitários.

Não seria exagero declará-la a "Lula de saias", ainda que Marina, por sua trajetória própria e personalidade forte, não careça de bases referenciais. Seu chão é sua história e a crença em um modelo atual de desenvolvimento sustentável. Sobre ela, não se pode apregoar radicalismos, como sempre tentaram anexar a Lula, tachado muitas vezes de "comunista". 

Serena, altiva, elegante, com o desenho do povo brasileiro em seus traços fortes de gente aguerrida do Norte,  Marina sinaliza um cenário promissor na política brasileira. Pinta como o grande quadro político do Brasil do século XXI. Lembrem que Lula, em 1989, com todo seu capital político associado à luta dos trabalhadores, teve 16 milhões de votos, três milhões a menos que Marina agora. 

É hora de alçar novos voos. Estamos há 16 anos sob o governo do PSDB e do PT. O Brasil precisa de uma terceira via. Marina nos espera em 2014. Torço por isso. "Estamos em primeiro lugar no turno de uma nova política que se inaugura no Brasil”, afirmou ontem Marina Silva.

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Depois de exageros, a briga político-jornalística

O recente encrudescimento da relação entre o governo Lula, através do próprio presidente, e a grande mídia nacional fez brotar discussões calorosas e análises subsequentes que perpassam por temas caros como censura à liberdade de expressão e de imprensa, mídia partidária, jogo politico eleitoreiro e opinião pública.

Vou presumir que os leitores já saibam de todo o contexto, para não me tornar chato em repetições de assuntos dados de forma tão enfadonha, inútil e inescrupulosa. Bem, Lula se excedeu em algumas declarações sobre o comportamento da imprensa. Os jornais e revistas também, numa tentativa de contra-ataque. O mais recente e enérgico veio do jornal Extra. Veja aqui.

Por um lado, não se trata, como o presidente acredita ou pretender fazer crer, de uma mídia político-partidária, mas apenas partidária. E ela toma parte dos seus negócios jornalísticos. Então, que empresa de comunicação capitalista não publicaria denúncias de tamanha gravidade, como as que envolvem a ex-ministra Erenice Guerra?  Ainda que a narrativa seja abusiva em muitos casos, ela não foi inventada e provavelmente iria a público caso se tratasse de outro governo, como vimos exemplos inúmeros na era FHC.

Sei que a denúncia da revista Veja é inconsistente em muitos pontos. Não responde a uma pergunta crucial por exemplo: qual o interesse do lobista Fábio Baracat, sócio do filho de Erenice, em denunciar um esquema do qual ele mesmo fazia parte e se beneficiava? Já no caso do tal de "receitagate", porque um fato ocorrido em 2009 veio a público somente agora? Mas isso não minimiza as denúncias.

Na outra ponta, Lula está longe de ser um estadista autoritário que tenha intenções de controlar a imprensa. É fantasioso, histriônico e distorcido o levante da grande mídia nacional contra supostas medidas de censura por parte do governo. A proposta do Conselho Nacional de Jornalismo (CNJ) veio da própria Associação Nacional de Jornalistas (ANJ) e o controle social referido no Plano Nacional de Direito Humanos 3 foi abertamente discutido com a sociedade em simpósios e congressos, dos quais os grandes empresários de comunicação, apesar de convidados, ausentaram-se.  E uma coisa é controle social, outra é censura.

Disso tudo, uma certeza. A acachapante popularidade de Lula (80% de aprovação) e a provável eleição de Dilma Roussef no primeiro turno mostram que o presidente acertou ao dizer que a "opinião pública somos nós", ou seja, o povo, e não o governo, como as interpretações jornalísticas insistiram em entender. A verdade é que o jornalismo tem perdido a posição mais privilegiada na formação da opinião pública, a ponto dessa não poder mais coincidir ou ser confudida com a opinião da grande imprensa.  

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

A segmentação jornalística da violência

Lia o livro "Assalto ao Poder - o crime organizado", do jornalista Carlos Amorim, quando me ocorreu um estalo. Em uma crítica lúcida sobre a banalização da violência, refletida sobretudo na cobertura jornalística, Amorim registra, com lamentos, que a mídia ou deixa de cobrir a violência urbana por considerá-la insignificantemente cotidiana demais para ganhar o apreço jornalísitco, com exceção dos grandes acontecimentos, ou faz dela um grande espetáculo de horror.

Ele tem razão. Mas meu ponto é outro. Qualquer pessoa que tenha lido alguma coisa sobre violência urbana no Brasil sabe que as suas maiores vítimas são jovens pobres, sobretudo quando falamos em crimes contra a vida. Isso é fato, mas não deixa de me causar espanto um fenômeno, de natureza empresarial-jornalística, pelo qual passamos a ter, sob o argumento do direcionamento de conteúdo condizente a cada público-alvo, uma classificação da violência, aquela de rico, e aquela de pobre.

Na esteira da criação dos jornais populares, vejo empresas de comunicação defenderem duas narrativas jornalísticas  para o mesmo fato - uma no produto popular com ênfase no drama pessoal decorrente da violência, sensível às sensações, por assim dizer, para evitar o jargão "sensacionalismo"; e outra, atenuando os reflexos das mazelas criminais e, em princípio, atenta às causas do fenômeno. O cenário já é preocupante, no entanto se agrava porque o tema, sob a rubrica "Segurança", tem perdido importância nos grandes jornais, para se tornar quase exclusivamente matéria-prima da mídia popular.

Essas segmentações, do ponto de vista empresarial, são compreensíveis, mas são problemáticas do ponto de vista sociológico - e sob esse viés que minha burrice teima em me fazer ver e praticar o jornalismo. Torna-se extremamente reducionista acreditar que o público das classes ricas - ainda que acredite nisso - seja imune  ou defeso à violência urbana cotidiana, aquela vista como expressão da chamada "guerra civil não declarada", comumente associada  às áreas periféricas. O jornalismo está contribuindo para acentuar o discurso do apartheid social e dele próprio, ao invés de denunciá-lo e combatê-lo.

Bom que Carlos Amorim venha num esforço contínuo e brilhante de mostrar o problema da violência no seio de toda a sociedade, conectada ao crime organizado e ao poder, especialmente o econômico. Curioso que acabo de ler uma notícia na Folha Online: "Polícia prende 16 jovens de classe alta por tráfico de drogas no Rio". E aí a dúvida: vai para o jornal tradicional ou para o popular? E sob que critérios e nuances narrativos?  

sábado, 4 de setembro de 2010

Santo André: o vespeiro petista

Mais uma vez Santo André. O que esconde essa cidade paulista? Os mais enfadonhos, sujos e vis esquemas ligados ao PT brotam dali.  O que já vem sem chamado de "fiscogate"  - a quebra ilegal dos sigilos fiscais da Receita Federal de 140 pessoas, entre elas pelo menos quatro tucanos e a filha de José Serra -  tem na cidade seu epicentro.  

Algumas das operações identificadas como fraudulentas foram realizadas em computadores da agência da Receita Federal em Santo André, com a senha da servidora Antonia Aparecida Rodrigues dos Santos Neves Silva, inclusive a quebra do sigilo dos tucanos.

De Santo André também vem o novo personagem principal dessa história cabeluda do "fiscogate", o Antonio Carlos Atella Ferreira. Foi ele que com uma procuração falsa conseguiu os dados da declaração de renda de Verônica Serra, filha do presidenciável tucano. 

A Receita confirmou que a declaração de renda de Veronica referente aos exercícios de 2007 e 2009 foi acessada em 30 de setembro do ano passado na delegacia do fisco em Santo André. O documento falso solicitando os dados foi entregue por Atella, que se apresentou como procurador da filha de Serra.

Também não podemos deixar de lembrar do misterioso caso Celso Daniel, político assassinado em 2002 quando era prefeito da mesma cidade de Santo André. Pois bem, para quem quer meter a mão no vespeiro petista, deve começar por lá.

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Poder do exército, poder do povo

Estou na fila para tirar a segunda via da carteira de reservista do Exército. Última quinta-feira, 02, às 8h da manhã, já havia pelo menos quarenta homens concentrados à porta do prédio número 03 da rua Chile, Centro Antigo de Salvador. Chegaram ali por volta das 6h, a maioria para jurar a bandeira, procedimento necessário para o alistamento junto às Forças Armadas.

Há onze anos cumpri o mesmo ritual. Cometi o vacilo de deixar minha carteira de reservista dentro de outra carteira, a de dinheiro (que, coitada, quase nunca o vê). Pois bem, roubaram-me. E lá se vai eu novamente acordar cedo - um pouco menos cedo desta vez, há uma década precisei chegar no quartel de Amaralina às 5h da matina - e refazer este documento tão fundamental. Sem ele, nada de tirar passaporte e garantir um cargo público por concurso.

As peculiaridades do Exército continuam as mesmas. Mecanismos altamente hierarquizados e burocratizados, a ponto de uma expedição de segunda via de documento levar nada menos que cinco horas, sob os gracejos nada inteligentes, desnecessários e, às vezes, abusivos,  dos sargentos de plantão, exibindo um poder que já não mais cultivam espontaneamente.

Durante a demorada espera, ouvem-se comentários sobre a conduta e o despreparo da infraestrutura para prestação do serviço. Se chovesse, pelo menos metade dos quarenta homens ia ter que aguardar feito pinto molhado do lado de fora - a sala de recepção não tinha capacidade para acolher todo mundo. Bem, e enfezar-se com os gracejos milicos era bobagem, correr o risco de ser obrigado a voltar outro dia, e, quem sabe, ter a sorte de fazer a carteira.

Mas lá pras tantas, do poder do sargento Miranda, era ele quem organizava o serviço naquela quinta, a conversa mudou para o poder político no sentido estrito de Estado. Três camaradas comentavam a gestão Lula, consideraram-na ótima, assim como 77% da população brasileira.

Curioso, foi o comentário de um deles. "Antes para comprar um pisante bom (tênis) você pagava até R$ 500, eu comprava uns de R$ 100, tudo vagabundo, não durava nem um mês. Hoje com isso, eu compro um pisante decente", disse. "Os ricos estão pirados porque Lula deu para os pobres, e neguinho pensa que pobre é burro. Deus deu inteligência a todo mundo, não tem essa história de burro, até a natureza é sábia", completou.

Não sei o nome dele. Sei que foi embora sem a carteira de reservista. Resolveu voltar no dia seguinte, porque tinha que trabalhar pela tarde, e já eram mais de 11h30. O processo dele foi difícil aquele dia. O sargento lhe disse que não havia registro algum dele no sistema e ele teria que fazer todo o processo de segunda via novamente. Segundo contou, já havia pagado a taxa e multa cobradas pela confecção da carteirinha, mas o sargento exigiu novo pagamento.

Duro, com o dinheiro só da passagem, foi salvo pela doação dos R$ 7 da taxa e multa. Fiquei com pena do camarada. Na verdade, é um vacilão porque se havia pagado uma vez era só mostrar o recibo de pagamento ao sargento. Sei lá, lembrei dele ao ler novamente o texto aí embaixo. Ele tem razão... De burro, o povo não tem nada.

quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Um voto mais que consciente

Acabo de ver na TV uma propaganda do Ministério Público Federal alertando para o absurdo de "vender" o voto em troca de mimos, favores ou empregos.  O anúncio televisivo simula um programa de auditório onde a participante do quadro tem que responder à seguinte pergunta do apresentador: a senhora opta por um hospital público novo ou uma dentadura?

A participante se encontra dentro de uma cabine da qual, presumo, ela não pode ouvir a pergunta lhe direcionada e deve, assim, respondê-la no escuro. É um esforço do MPF para demonstrar que a venda do voto é politicamente inconsciente e gera resultados catastróficos. Muito boa a iniciativa.

Mas da propaganda fiquei pensando. Até que ponto a "venda" do voto em troca de uma mínima dentadura, ou mesmo uns sacos de cimento, ou meses de cesta básica etc etc, é de fato politicamente inconsciente? Que é catastrófica, disso eu não tenho dúvidas. 

O brasileiro abaixo da linha de pobreza (hoje são 43 milhões nessa situação) olha para sua condição política  - quer dizer suas possibilidades dentro da pólis, da cidade, de quem tem renda suficiente apenas para comprar comida e os que têm menos ainda - e põe na balança se vota naquele candidato que lhe promete um hospital público ou naquele do saco de cimento, uma dentadura, uma cesta básica etc etc etc. Coisas que lhe chegam de pronto, diferente das promessas eleitoreiras deslumbrantes e, da maioria das vezes, inexecutadas. 

Parece-me bastante consciente. Tão quanto como à época da colonização portuguesa em terras tupiniquins, quando os índios, por muito historiadores considerados ingênuos, trocaram riquezas naturais, como o Pau Brasil, por bugigangas europeias, a exemplo de espelhos.  Para alguém que nunca havia se visto tão claramente, a não ser pelos reflexos pouco clarividentes dos espelhos d'água dos rios e lagos, conceder árvores, de que sua terra era farta, em troca de apetrechos tão sofisticados, era um grande negócio.

Na verdade, todos utilizam de seus recursos - o voto é um recurso democrático - para melhorar sua condição existencial, em nossos dias essencialmente política. Se há de prática ilegal ou imoral trocar o voto por um prato de comida, advirta àqueles que o negociam por um bom emprego.

Lembre que até mesmo jornalistas, ditos e autointitulados os tutores da democracia e do voto consciente, lembre que muitos deles em anos de campanhas prestam seus serviços, e sua consciência jornalística, portanto política, para esses mesmos políticos que não titubeiam em conceder uma dentadura enquanto prometem um hospital público novo. 

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Mijar na rua pode levar à prisao

Esta conversa agora do prefeito João Henrique querendo punir os mijões de plantão da cidade é, por enquanto, no mínimo esquizofrênica. Pelo menos até tivermos a infraestrutura necessária para cobrar tal civilidade fisiológica. Se não for nos postes, aonde é que os soteropolitanos vão dar aquela mijadinha quando estiverem em apuros no meio da rua?

A capital conta hoje com 200 sanitários moveis. A prefeitura anunciou a implantação de mais 50 mictórios públicos pela cidade para evitar a urinada nas vias. Ainda é pouco, acho. São quase três milhões de habitantes, o que dá uma média de 12 mil pessoas para cada banheiro.  

E a questão numérica nem é a mais crônica, mas a qualidade dos banheiros. Aqueles químicos, que costumamos ver em lugares turísticos, como o Centro Historico e Farol da Barra, e também  no Carnaval, são de arrepiar a espinha.

Na verdade, esse negócio de banheiro público é uma coisa muito natural pelo mundo. O mictório é um equipamento urbano como um banco, um semáforo, uma placa de trânsito. Em Amsterdam, na Holanda, por exemplo, os banheiros são sinalizados (foto acima), e não raro, você pode se deparar com um banheiro como esse da foto ao lado. Olha eu aí dando a minha mijada, ao ar livre, sem portas, sem a sensação claustrofóbica que dão esses banheiros químicos daqui. Ah, sim, e com a privacidade suficiente para colocar o pinto para fora.

Em tempo, não esqueçam que guardas municipais vão fiscalizar as ruas de Salvador junto com policiais militares. Quem tiver mijando em via pública poderá ser preso, com base no Código Penal, capítulo VI (ultraje público ao pudor - Art. 233, que prevê detenção de três meses a um ano, ou multa).

sábado, 7 de agosto de 2010

Capa irreverente e ousada, bom para o jornalismo


Não sou Bahia nem Vitória, não torço, na verdade, para time algum. Por isso sobre a polêmica capa do Correio anunciando o vice-campeonato do Esporte Clube Vitória na última quinta-feira, 5, falo estritamente do ponto de vista jornalístico.

Uns, rubro-negros na maioria, estão indignados com a capa por acharem que ela desrespeita o time e a torcida, que lutaram e muito ansiaram pelo título inédito. Outros, muitos tricolores, evidentemente, acharam a capa superdivertida e criativa.

A direção do Esporte Clube Vitória ficou irritada com o jornal e disparou: "A diretoria do E.C.Vitória vem a público repudiar a capa do jornal Correio desta quinta-feira, dia 5 de agosto, que de forma jocosa tentou denegrir a imagem desta gloriosa agremiação, menosprezando o sentimento da imensa nação rubro-negra. Engana-se quem pensa que nós, torcedores do Vitória, sentimo-nos derrotados ou fracassados, pelo contrário. Após quatro anos saímos da Série C para fazermos uma final histórica em nosso santuário, o Barradão".

Como jornalista, acho que o Correio foi felizmente ousado e fugiu ao padrão da cobertura esportiva que monotoniza os jornais em manchetes do tipo "Vitória ganha, mas não leva". Vale lembrar que antes da final o Correio fez uma capa do mesmo estilo mostrando a estrela em cima do brasão do clube, simbolizando assim o desejo de milhares de torcedores baianos. 

O esporte dá margem ao senso de humor e foi disso que os editores do Correio lançaram mão, sem perder a qualidade informativa. Nada aí tem que ver com imparcialidade e ética. Só sentiu-se desrespeitado quem não tem espírito esportivo.

Em tempo, cabe lembrar à direção do Vitória que é politicamente e até eticamente incorreto fazer uso da palavra "denegrir", que também significa tornar negro, para alcançar o sentido de manchar, de macular uma reputação, uma pessoa, uma imagem, etc. Em uma cidade onde 80% da população é negra, esse cuidado se faz mais premente do que se indispor e criticar a liberdade criativa e bem-humorada de jornalistas.

sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Meu voto é de Marina

Hoje sou daqueles que acreditam na aposta. E entre os quatro candidatos à presidência da República, que fizeram ontem o primeito debate televisivo destas eleições, aposto em Marina Silva, do Partido Verde (PV).  

Dispenso a tecnocracia mesclada ao tom lulopetista da canditada Dilma Roussef. É injusto não ganhar por méritos próprios, sustentando-se na absurda popularidade do presidente Lula. A proposta de Dilma calca-se no continuismo, o que por um lado é excelente, mas por outro pode levar à paralisia da austeridade fiscal.

Desprezo o radicalismo do candidato do Psol, o Plínio Arruda, pois desafia um sistema econômico ainda desigual e concentrador de renda apenas com retóricas vazias e pirotécnicas, sem apresentar alternativas plausíveis de outro modelo de gestão que leve ao desenvolvimento geral do País. É bom para o debate, porque joga nele certa pimenta, mas desnecessário para levar o Brasil ao centro dos grandes temas mundiais.

Antipatizo, não vou mesmo com a cara de José Serra. Um político de biografia invejável, ideias de gestão claras, no entanto sem uma autenticidade que o torne uma liderança a altura da posição do País hoje no cenário mundial. E, além disso, sua proposta de gestão não difere muito da candidata Dilma.

A Marina, não. Ela tem o arcabouço ideologíco e técnico condizente às atuais e mais importantes questões da economia mundial. Pela primeira vez, os habitantes poderosos desse planeta azul estão pensando em ganhar dinheiro através de formas sustentáveis, não porque se tornaram os melhores homens do mundo, mas porque se deram conta que isso pode realmente gerar muita riqueza. Marina, a nossa ecocapitalista, diria Plínio, entende isso muito bem.

Meu voto é dela. Embora minha convicções religiosas, melhor, não religiosas, sejam séculos longe das dela. Mas isso é outra história. Nosso estado é laico.  

domingo, 18 de julho de 2010

Uma outra janela

Volto à minha janela depois de aproxidamente um mês longe dela. Do parapeito pelo qual há 15 anos percebo o mundo e dialogo com ele, retorno a observar a tranquila rua de paralelepípedos estendendo-se à direita e à esquerda, meus acessos seminais à cidade da Bahia, à província soteropolitana. Olho, e desta vez há algo de diferente. A tranquilidade habitual é a mesma, as depressões da via também, o horizonte imutável que deslumbra visões múltiplas, porém, é igualmente diferente.

Um passeio turístico pela Europa de 26 dias ao lado de minha namorada, Verena, foi suficiente para que minha janela se tornasse pequena e engrandecidamente mais acolhedora. Passeamos por seis grandes cidades europeias (Madrid, Barcelona, Paris, Amsterdam, Berlim e Bruxelas), em cinco países (Espanha, França, Holanda, Alemanha e Bélgica), apreciando seus principais pontos turísticos, mas atentos a outras peculiaridades, através de nossas longas caminhadas pelas ruas. 

Quero compartilhar com meus poucos leitores as experiências e percepções que resultaram dessa viagem. Aos poucos vou escrevendo sobre as diversas situacões vividas no Velho Mundo, as curiosas, engraçadas, constrangedoras, difíceis e por ai vai. Estou também de volta à minha janela virtual.  

sexta-feira, 11 de junho de 2010

Que a bruxa pare por aí!

Antes mesmo da Copa do Mundo da África do Sul começar, a bruxa andava solta aos redores do mundial. Em amistosos de preparação para o torneio, o craque da Costa do Marfim, o atacante Didier Drogba, quebrou o cotovelo e ficou de fora da competição.

A seleção canarinho já enfrentou contusões de Luís Fabiano, Kaká, Michel Bastos e a mais precupante, a do goleiro Júlio César, cujas dores nas costas seguem incomodando o arqueiro. Já a Holanda vai estrear na Copa sem o craque Robben, do Bayern, que sofreu um contusão no joelho em um amistoso preparatório. E a Alemanha teve que aceitar a ausência do "Kaká alemão", Michael Ballack. O meia se contundiu em partida da Copa da Inglaterra.

Fora de campo, as perdas também foram siginificativas, na verdade maiores. O tenor sul-africano Siphiwo Ntshebe, conhecido em seu país como "Pavarotti Negro" e que era um dos artistas escolhidos para participar do show de abertura da Copa do Mundo, morreu em decorrência de uma meningite 16 dias antes de começar o grande espetáculo do futebol.

Não bastasse, uma notícia muito triste foi divulgada anteontem. Após deixar o Soccer City, onde foi realizado o show de abertura da Copa, uma bisneta de Nelson Mandela se envolveu em um acidente de carro e faleceu horas depois, já na manhã de ontem. Por conta da tragédia, o grande líder sulafricano não compareceu à cerimônia oficial de abertura do mundial, realizada minutos antes dos Bufanas Bufanas jogarem contra o México a primeira partida da Copa.

Que a bruxa fique por aí e que daqui para frente o espírito de resistência e luta pela paz do povo sulafricano tome os campos e bastidores da grande festa da bola.

segunda-feira, 7 de junho de 2010

A Taça é nossa, é?

O produtor artistico e estudante de Direito, Márcio Costa, refletiu sobre o logo da Copa do Mundo de 2014, no Brasil, e escreveu o artigo abaixo:

A Fifa divulgou o símbolo da próxima Copa do Mundo que será sediada aqui no Brasil. Uma peça publicitária interessante: a taça com várias mãos nela. Veio-me à cabeça logo a sensação de perseguição, de menosprezo, a tão falada síndrome do patinho feio, ou ainda melhor a síndrome do "só por que sou pobre doutor"?

Porque até numa peça publicitária de um símbolo que representará nosso País num mundial, tenho a sensação de que estão dizendo que querem roubar, furtar, afanar, dar um jeitinho, se beneficiar. Todos  querem colocar a mão, nem que seja o dedo, na taça. Mas pode ser uma figura de linguagem esse “colocar a mão na taça”. Digamos que os governos estaduais já começaram a colocar “a mão na taça”, estão só na espreita aguardando o prazo de inicio das obras ficarem no limite ou passar deles e começar a correr com obras de urgência. E o que vem daí? Prestações de contas frouxas e aumento no valor das obras para poderem ser entregues no prazo exigido.

Todos querem colocar a mão na Taça. As seleções literalmente querem ganhá-la pelo mérito em campo de ser o melhor time da terra, mas muitos querem apenas melar o dedo em tudo que envolve este magnânimo evento, que é o maior do mundo, do universo, quiçá da galáxia, e envolve milhões de cifras em tudo; durante um mês, um único mês, que será revelado o melhor em quatro anos, aquele a quem a tão sonhada taça será levada, quando atletas em momentos de êxtase entrarão para história ao pegarem-na, levantarem-na e finalmente passarem a mão nela,  mas ao mesmo tempo, num momento lúdico, passarão a mão como se brinca com o impossível, o irreal, com o objeto tão sonhado pelos milhões de moradores deste planeta: a cobiçada superioridade, para se transformarem em seres supremos.

Mas será que o símbolo foi desenhado pensando neles? Tenho minhas dúvidas. Criaram-na para representar um país onde ser esperto é como se fosse lei e tirar vantagem em cima de outra pessoa é quase uma instituída matéria escolar que será aprendida do maternal ao terceiro grau. A propina convive com todos aqueles que querem “passar a mão” e com aqueles que têm o poder de deixarem “passar a mão”.

Tá aí. Aqueles que têm o poder de deixarem “passar a mão” são responsáveis por essa imagem que temos no mundo. Até numa peça publicitária criada por profissionais de outro país para representar o meu país na copa do mundo de futebol que sediará, vem esse fantasma que atormenta a nação de que todos querem “passar a mão na taça”, até eu. Como faço, alguém me ajuda?

sexta-feira, 4 de junho de 2010

Jabulani, com muito prazer


Jabulani. No mundo da bola ela é a carne nova no pedaço, mas não tem sido nada celebrada pelos jogadores, sobretudo pelos brasileiros, apesar do nome significar "celebração", no idioma zulu. Na verdade, ela é a fibra em 11 gombos sem costura mais nova do pedaço, da África do Sul.

A bola da Copa, desenvolvida pela Adidas e que custa R$ 400 cada uma, é mais veloz, leve e mais arisca aos domínios futebolísticos dos nossos craques. "Essa bola é sobrenatural. A trajetória que ela faz é estranha, ela sai de você, parece que não gosta que alguém chute. Parece que tem alguém guiando, porque quando você vai chutar ou cabecear, ela muda a trajetória", avaliou o atacante Luís Fabiano. “A outra era igual a mulher de malandro, você chutava e ela ficava ali. Essa bola é igual a patricinha, não quer ser chutada", disse Felipe Melo, comparando a estreante às velhas conhecidas.

Jabulani parece que vai dá trabalho, não vai se render fácil aos encantos de pés milionários dos artistas da bola. Por enquanto, tem feito jogo duro, nada de abrir as guardas para seduções primárias ou cantadas infantis ou ultrapassadas. Se terá algo a revelar de bom ou de especial para agraciar os amantes da bola, tudo indica que vai deixar para o grande momento. Até  lá, o bom e disciplinado cortejo trará as melhores chances e oportunidades. E então, será a bola, e simplesmente, bola da vez!

quinta-feira, 27 de maio de 2010

Dois anos e 40 cigarros na boca

Duas coisas impressionam na historia de Aidi, um menino de apenas dois anos da Indonésia que fuma 40 cigarros por dia. Isso mesmo, uma criança que sequer controla suas necessidades fisiológicas já tem a capacidade mecânico-motora de sustentar um cigarro entre os dedos e "manipulá-lo" com os lábios a ponto de dar uma tragada.

Um gesto banal e burro dos homens adultos vira emblema da magnífica inteligência corporal humana. Isso realmente impressiona. Mas vem em conjunto com a percepção de que tal habilidade e competência corporais são  formatadas pelo exercício do hábito. Neste caso, a força do hábito, mesmo que  tenha consequências nefastas, é legitimado pela letra da lei. O pai do garoto estimulou o vício quando a criança estava aos 18 meses e acha natural a prática, também não cometeu qualquer crime. Isso realmente impressiona e muito.

A conclusão é uma só: vemos o espetacular potencial da inteligência corporal humana sendo desperdiçado pela inapetência de uma cognição absurda sob a influência de uma  "cultura" estúpida, em princípio inexplicável, mas desde que ela tenha no hábito seu ponto de sustentação.

sexta-feira, 21 de maio de 2010

Um viva aos meninos da Vila!

Três jogos foram suficientes para eu me tornar um santista de carteirinha. Eu que desde 1999 abri mão de torcer para o Flamengo e para qualquer outro time, traumatizado pelas exaustivas, esgotantes e irritantes discussões futebolísticas com meus colegas de escola. Pouco tempo depois, contaminado pelo exercício do pensamento lógico a que estamos submetidos nessa sociedade extremamente cartesiana, resolvi colocar a paixão pelo futebol a um patamar de perda de tempo estúpida.

As concessões e exceções cabiam aos jogos da seleção brasileira, movidas pelo sentimento de nacionalismo. Mas agora perenizam-se por se renderem ao futebol-arte dos meninos da Vila. A lógica que me fez desconsiderar as trocas extremamente ricas entre torcedores e times de futebol só se admitiu derrotada quando a experimentação estética da beleza futebolística santista trouxe à tona, como um rompante, o lado emocional que define o ser humano e que o faz se apaixonar pelo inexplicável. Viva aos meninos da Vila, que têm ressuscitado a magia alegre do nosso futebol e inflado corações outrora murchos pela padronização da mediocriade e da operacionalidade reducionista dos jogadores modernos.

É uma pena que a coerência lógica do treinador Dunga não tenha se curvado aos dribles, passes, gols, enfim às peripécias de Ganso, Neymar e André. Na seleção, Robinho terá que comandar o espetáculo sem seus parceiros acrobatas da bola.

sábado, 15 de maio de 2010

Jornalista deve assumir o que escreve sempre

Jornalistas devem ter muito cuidado com aquilo que escrevem. Uma palavra errada, mal escolhida, erroneamente reproduzida, ou colocada fora de lugar, pode trazer consequências desastrosas, à sociedade, à fonte e ao próprio repórter. Mas o erros sempre vão aparecer. E, diferente da postura que a mídia brasileira tem adotado, de se colocar acima de qualquer suspeita, o comportamento ético, honesto e digno é o de assumir os equívocos, não ignorá-los ou escamoteá-los.  

Por isso, sem pesares e abertamente, assumo a imprecisão de minha matéria "Empresas disputam lixo de Salvador", publicada na edição de ontem do jornal A TARDE, especificamente na reprodução direta da declaração da subprocuradora-geral  do município, Angélica Guimarães, que fiscaliza o andamento legal do processo de licitação pública que irá definir a empresa a prestar o serviço de limpeza urbana da cidade. A saber, a declaração publicada: "Há muita pressão porque os empresários que estão atuando na área não querem sair". A subprocuradora referia-se a uma avalancha de impugnações movidas por empresas que hoje prestam o serviço (dominam o mercado há mais de 20 anos), questionando o processo licitatório com intuito de retardar ao máximo o processo.

Bem, na matéria não tive o cuidado de explicitar inequivocadamente a que a declaração se referia, embora tenha escrito acima dela sobre a possibilidade das empresas impetrarem  novas ações e sobre as diversas impugnações anteriores.  A saber: "A subprocuradora-geral do município, Angélica Guimarães, afirmou que espera receber novos questionamentos sobre o processo de licitação. Antes da abertura da concorrência pública, o edital foi alvo de várias impugnações".

A palavra "pressão" não contextualizada inequivocadamente deu margens a interpretações como a o do site Bahia Notícias, que comentou sobre a declaração: "'Há muita pressão porque os empresários que estão atuando na área não querem sair', afirma Angélica Guimarães, a subprocuradora do município, sem entretanto explicitar quais tipos de pressões sofre do empresariado". Em nenhum momento da matéria falei sobre pressões por fora, extras ou sobre qualquer outra natureza de pressão, que poderia colocar a integridade da subprocuradora em jogo. Mas não culpo a maliciosidade emprestada ao meu texto, porque ele realmente deixou brechas interpretativas.

Sem mais, está aí um bom exemplo, vivido na pele, de que é necessário o repórter ter um cuidado redobrado com o que escreve.  Sempre soube disso, mas não sou infalível, e reconhecer tal condição penso ser a melhor maneira para evitar a repetição dos erros.  

quinta-feira, 29 de abril de 2010

Coréia do Norte proíbe mulheres no volante

No Brasil, o nosso machismo, enraizado na nossa entranha cultural embora moderado pelas arestas do politicamente correto e do civilismo do bom senso, sempre cunhou às mulheres, mesmo que como pilhérias, a pecha de "barbeiras".

E fomos crescendo com tiradas nem sempre engraçadas como "mulher pilota fogão", "mulher no trânsito perigo constante" e por aí vai. Mas o que tem se passado na Coréia do Norte está longe de ser resquício machista travestido de senso de humor escrachado. Nada mais é que um atentado à condição humana, sujeita de direitos, considerados universais, das mulheres daquele país.

Lá o engraçado é trágico. Sob a alegação de que já causaram muitos acidentes no trânsito na capital Pyongyang, as autoridades simplesmente proíbiram as mulheres da cidade de dirigir carros e, pasme, bicicletas. E, lembre-se, elas já eram proibidas de fumar em público também. Veja mais aqui

quarta-feira, 28 de abril de 2010

Coelba: Má comunicação alimenta crise

O recente caso da Coelba é o antípoda do papel de uma boa assessoria de comunicação frente a denúncias potencialmente desencadeadoras de crises. Há quase duas semanas, circulam na mídia baiana registros de seguidas e contundentes reclamações sobre o repentino aumento, em alguns casos de 700%, das contas de luz em Salvador.

Resposta da empresa pertencente à holding NeoEnergia, através do superintendente da Coelba, Ricardo Galindo: o aumento da temperatura fez com que os usuários consumissem mais energia. A explicação, estapafúrdia, foi dada a todos os órgãos de comunicação locais, inclusive em entrevista exclusiva gravada para a TV Bahia.  

A pressão foi tanta - o Ministério Público exigiu explicações razoáveis - que anteontem Ricardo Galindo recuou e admitiu ao jornal A Tarde a possibilidade de haver erros técnicos na contagem de luz e que cada reclamação seria estudada pontualmente para identificá-los.

Primeiro equívoco: é sabido que toda assessoria de comunicação deve orientar aos porta-vozes da empresa a qual assessora sempre a dizer a verdade, mostrando as causas técnicas dos problemas e enumerando e explicando as atitudes da empresa para saná-las. Mesmo se a assessoria de comunicação da Coelba chegou a fazer tal orientação ela não conseguiu ser ouvida, ou seja, não foi convincente o bastante para mostrar aos executivos as consequências de esconder os reais motivos do aumento das contas de luz. Se é este o caso, a assessoria não conseguiu fazer da comunicação parte integrante e vital na configuração estratégica da empresa.

Segundo equívoco: dentro de uma crise, mudanças de posição da empresa não podem ser drásticas. Se isso é inevitável, como é o caso, não podem ser escamoteadas. O superintendente admitiu haver a possibilidade de erros técnicos na cobrança, sem jogar  fora a hipótese estapafúrdia antes apresentada como verdade absoluta. Caberia à assessoria fazer valer um pedido de desculpas formal da empresa à sociedade, nem que fosse atribuindo à rídicula explicação uma falta de informação inicial.

Terceiro e maior equívoco: para piorar a crise, a empresa soltou ontem uma nota oficial à imprensa, insistindo na tese da elevação de temperatura atípica nesses últimos meses como causa do aumento repentino das contas de luz.

Conclusão: esse caso é exemplar de como uma assessoria de comunicação não apenas deixa de evitar uma crise como a alimenta e a agrava.

sábado, 10 de abril de 2010

Reféns da chuva

Fonte: Ingrid Dragone (maio de 2009)

Nenhuma cidade suporta - sem estragos, problemas e transtornos para a população - uma chuva forte e concentrada que atingiu o Rio de Janeiro nessa semana. Em um dia caiu 260 mm de chuva, quando estava previsto pelos centros de metereologia cerca de 70 mm. A grande questão, na verdade, é evitar mortes. E isso significa relocar a população moradora das áreas de risco e evitar novas ocupações indevidas, além de uma política de esgotamento e escoamento de água que amenize os alagamentos. 

Aqui, na nossa soterópolis, a prefeitura programou ano passado, logo após o período de chuvas fortes, em maio, quando houve sete mortes, uma série de obras de contenção de encostas. Foram previstas 52 intervenções, 32 foram concluídas. Outras 18 que estavam em andamento nos primeiros meses deste ano, foram interrompidas porque a empresa contratada para executar as obras alegou falta de recursos para dá prosseguimento ao empreendimento. 

Engraçado que a capital baiana recebeu o maior volume de recursos do programa de Apoio a Obras Preventivas de Desastres, do Ministério da Integração Nacional. Em 2009, recebeu R$ 40 milhões dos R$ 190,5 milhões destinados a prefeituras baianas. Lembremos que no mesmo ano, 51,3% da verba destinada à prevenção de desastres pelo ministério no País ficou com a Bahia, segundo constatou auditoria do Tribunal de Contas da União.  

A pergunta que pesa aos soteropolitanos é: como faltaram recursos para a empresa Nova Fucs então? O silêncio por enquanto na imprensa e das autoridades faz lembrar como os resultados podem ser positivos caso se invista o dinheiro em tecnologia preventiva. Caso dos Estados Unidos, onde é em Nova York, uma sala, espécie de "cérebro" da cidade, recebe informações via satélite com antecedência de até cinco dias sobre as mudanças climáticas.

No Brasil, os metereologistas chegam a ficar com "buracos" de informações climáticas de até três horas. Isso porque não contamos com satélite próprio. Usamos o dos americanos, que deixa de fazer a varredura no nosso território quando sobrecarregado. Além disso, o País tem carência de antenas receptoras dos sinais do satélite. Hoje são 20, quando deveriam ser uma centena, segundo o Centro de Previsão de Tempo e Estudo Climáticos (Cptec).


segunda-feira, 5 de abril de 2010

O que eram aqueles olhos?

Bairro de Castelo Branco, Salvador. Duas semanas atrás. Era uma tarde normal, embora uma mãe e seu filho houvessem sido assinados quando voltavam para casa na noite anterior. Maria de Lourdes, 40 anos, e L.V., 14, foram gravemente feridos por muitos tiros e tombaram na rua. Por quê? Por quem? Para quê? Quem eram aquelas vítimas?

A sociedade ainda não sabe. Como não sabe como era a vida de muitas outras vítimas da violência em Salvador. Isso pouco importa. A maioria das pessoas assassinadas na cidade não é importante, e a maioria dos crimes não é solucionada. Torna-se apenas estatísticas, como tudo. Na verdade, não é nossa culpa. Mas é nossa responsabilidade. Como jornalista, tenho coberto muitos assassinatos e sequer sei quantas matérias escrevi sobre isso. Significa que eu, (e, penso, meus colegas também), não estou ligando muito. Imagine as pessoas que jamais estiveram nas cenas dos crimes.

Então por que a história de Castelo Branco chamou tanto minha atenção? Somente porque ainda estou tentando esquecer aqueles pobres e silenciosos olhos. Daquela tarde, ainda lembro aquele garoto negro e magricela olhando fixamente para mim como estivesse sempre amendrontado por alguém ou alguma coisa. Provavelmente, ele sabia o que havia acontecido na noite anterior, mas não teve a coragem de pensar sobre isso, apenas sentia o clima pesado sob o qual se acostumou a viver. Daí, ao mesmo tempo que não dizia nada com a boca, contava tudo através dos olhos. Era uma espécie de medo e força misturados que faziam dele um misterioso, intrigante e amendrontador adolescente, ou homem, quem sabe. 

Como me colocar no lugar dele? Ainda não tenho a habilidade de compreendê-lo, embora eu tenha tentado. Honestamente. É muito difícil olhar em volta e perceber sua vida perder o sentido dia após dia. Acho que é assim o significado da vida dele. E desta maneira, ninguém pode enxergar o mundo com olhos iluminados, mas apenas com olhos tristes. 

domingo, 28 de março de 2010

Salvador em "guerra" II

A propaganda do governo baiano, vista por diversos outdoors na capital, atribuindo ao consumo de crack a causa de 80% dos homicídios na Bahia, tem recebido críticas severas de especialistas da área.  

No seminário da última sexta-feira, citado abaixo, o ex-secretário nacional de segurança pública José Vicente da Silva foi enfático. “Em São Paulo, existe uma região no centro da capital paulista, chamada Cracolândia, onde há o tráfico dessa droga e grande concentração de viciados, mas nem por isso há homicídios como vem acontecendo atualmente na Bahia”, afirmou com base nos dados comparativos das cidades de Salvador e São Paulo.

O psiquiatra Esdras Cabus Moreira, do Centro de Estudos e Terapias do Abuso de Drogas (Cetad), da Universidade Federal da Bahia, também critica a relação direta entre violência e consumo de crack. “Os homicídios não aumentam porque as pessoas estão usando crack. A violência está ligada ao contexto do tráfico de drogas em um sentido amplo, de um forte comércio envolvendo muito dinheiro. Ela não tem no crack uma causa interna“, afirmou a esse blogueiro no último dia 17.

Salvador em "guerra" I

Salvador é hoje mais violenta que São Paulo.  Em 2009, 2,2 mil pessoas foram assassinadas na capital e região metropolitana, número superior à quantidade de homicídios registrados em São Paulo no mesmo período – 1,2 mil. Nos últimos três anos, a capital paulista conseguiu reduzir sua taxa de homicídios em 39%. Por aqui, o crescimento foi de quase 90%. Os dados foram divulgados durante o seminário “Segurança pública, um desafio político na América Latina”, promovido em Salvador na última sexta-feira (26) pela Fundação Liberdade e Cidadania do (partido) Democratas e Fundação Konrad Adenaur.

sexta-feira, 19 de março de 2010

Pense num absurdo, esse tem cheiro

Fotomontagem
Às 17h25 de ontem, recebo uma ligação de um amigo. Estava indignado. "Você já deve ter ouvido aquela frase: ´pense num absurdo, já aconteceu na Bahia`", disparou para início de conversa. Referia-se à frase do ex-governador da Bahia Otávio Mangabeira, que originalmente é "Pense num absurdo! Na Bahia tem precedente!".  Vamos à história.

O prezado amigo contava que comprou uma calça na loja Colombo, no Shopping Center Lapa, e após alguns dias de uso teve de colocá-la para consertar, devido a um defeito no zíper. Até aí tudo bem. Deixou o produto com um vendedor, que ficou de informar quando a roupa estivesse pronta. Passou uma semana, ele resolveu voltar à loja para cobrar o conserto. Veio a surpresa.

- "Senhor, infelizmente não pudemos fazer o reparo em sua calça porque o costureiro se recusou a fazer o serviço", afirmou um vendedor.

- "Como assim?", indagou incrédulo.

- "O costureiro disse que sua calça estava fedendo muito!".  

Transtornado, ele pediu para falar com o gerente. Não adiantou. O gerente ratificou a versão do costureiro. O jeito foi pegar a calça, levá-la até a casa da namorada e perguntar a ela e a irmã se a calça estava realmente fedida. As duas não sentiram qualquer odor.

Foi nesse momento em que ele me ligou. Queria botar a história no jornal. Eu, confesso, embora concordando com o absurdo do ocorrido, dei boas risadas com o caso e disse que se dependesse de mim a história iria parar nas bancas, mas o jornal dificilmente teria espaço para esse tipo de contratempo. 

E o aconselhei a procurar o Procon ou a entrar com uma ação no juizado de pequenas causas. Porque, risadas à parte, o caso tem lá sua seriedade. Pense no constrangimento que ele passou na loja ao ser informado de que sua calça estava fedendo. É como se dissessem que ele não tem higiene. 

Nunca comprei na Colombo, depois da história, dificilmente colocarei meus pés por lá, só pensando no risco de ser confundido com Cascão.

ERRAMOS: A LOJA COLOMBO FICA NO SHOPPING CENTER LAPA E NÃO NA BAIXA DOS SAPATEIROS, JÁ FOI CORRIGIDO NO TEXTO

terça-feira, 16 de março de 2010

O transtorno da segunda via telefônica


Operadora de telefonia móvel é mesmo um pé no saco. Há seis dias venceu minha conta do mês de março e até hoje a fatura não chegou na minha casa.

Acomodado, resolvi tardiamente entrar no site da minha operadora para imprimir a segunda via do boleto. Pois bem, até agora espero chegar na caixa de entrada do meu celular a senha necessária para ter acesso ao arquivo da fatura.

O usuário, que deveria receber a conta em casa, tem o trabalho de acessar a página da operadora, criar uma senha e ainda esperar a dita cuja ser disponibilizada para imprimir a fatura, gastanto tempo, tinta e papel. Ah, e dinheiro, é claro.

Oi, Zé, é simples assim! Embora o título da história soe um filme trash.

segunda-feira, 15 de março de 2010

Sob a tônica da violência

O cartunista Glauco é assassinado no Rio Grande do Sul. Estudante de enfermagem morre ao cair de ônibus em Salvador. Adolescente baiano é barrado na Espanha. Mulher é morta a pauladas em Arempebe, no litoral norte. 

Depois de passar três dias num retiro natural como Morro de São Paulo, é duro e assustador voltar à esquizofrenia do nosso mundo, onde a violência, já banalizada, porque intrínseca ao funcionamento da sociedade moderna, dita sobre o que devemos colocar nossos olhos e depositar nossa atenção, mesmo que para retroalimentar um sistema vicioso, viciado e cíclico.

Enquanto isso, iludimo-nos ou nos deixamos iludir que as complexidades do desenvolvimento das instituições, políticas, sociais e sobretudo tecnológicas, é capaz e suficiente para organizar as coisas em tal medida e a tal ponto que possamos, um dia, nos livrar das mazelas que esse processo nos põe à frente. O exemplo mais gritante é a crença que o gigantismo do aparato repressivo consiga reverter os intintos e impulsos hostis rebelados.

Vejo o governo baiano anunciar orgulhoso a convocação e treinamento de 3,2 mil policiais militares e a aquisição de mais mil novas viaturas. Precisamos, na verdade, de menos pessoas que careçam de fiscalização das autoridades e não de mais fiscalizadores. Mas, diante da tragédia que nos cerca diariamente, o que fazer se não declarar guerra?

Eu gostaria mesmo é correr de volta a Morro, ou a outra reserva de mundo qualquer, onde o desenrolar da vida seja mais simples e mais saboroso, e, onde a liberdade reina com tons de paz.

sexta-feira, 5 de março de 2010

Mais carros do que a Alemanha

O jornal da Globo de ontem me deixou assustado. Noticiou que o mercado automobilístico brasileiro superou o alemão, assumindo agora a quarta colocação no ranking do setor. E, pasme, há muito, mas muito mesmo, espaço para crescimento. O Brasil tem hoje um carro para cada sete habitantes, enquanto na Alemanha há dois automóveis para cada cidadão.

Imagine. Se hoje a maioria das capitais brasileiras, inclusive Salvador, já é um grande conglomerado de carros, que realidade teremos daqui a dez anos, quando possivelmente estivermos de um para um? Uma sociedade de automóveis e não mais de pessoas. E pensar que, há muito tempo, já se criticava que o homem passara a ser avaliado pela marca do seu carro. No futuro, seremos literalmente o próprio.

Arruda preso: prenúncio de uma mudança

A decisão dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), por nove votos a um, de negar o pedido de liberdade do governador do DF, José Roberto Arruda, que segue preso, anuncia um processo já em curso de mudança das instituições brasileiras.

Como disse o ministro Carlos Ayres Britto, "dói em cada um de nós, na alma e no coração, ver um governador sair do palácio para a cadeia", mas essa dor, necessária e salutar, mostra um salto de qualidade dos mecanismos nacionais de controle social e serve como mola propulsora para mudanças fundamentais nos modos de ver da sociedade brasileira frente às relações de poder político.

A percepção de que a impunidade é inerente à ascensão sociopolítica pode começar a ser destruída a partir desses casos, dando lugar a uma assimilação mais acurada dos papéis e funções públicas dentro de uma sociedade democrática.   

Cotas: "Não é questão pessoal, é de toda a sociedade"


Terminam hoje as audiências públicas no Supremo Tribunal Federal sobre a constitucionalidade do sistema de cotas. As discussões foram abertas depois de chegar à Suprema Corte duas ações direta de insconstitucionalidade (Adin) contra a reserva de vagas.

Conforme informações do jornal Estado de S. Paulo, em uma delas o DEM questiona os critérios raciais utilizados desde 2004 pela Universidade de Brasília (UnB) para a admissão de estudantes pelo sistema de cotas. A outra foi apresentada por um estudante que se sentiu prejudicado pelo mesmo sistema adotado na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

É um Dia D para milhares de brasileiros por esse País afora. Só na Bahia, são mais de 20 mil cotistas, somados os alunos da Universidade Federal da Bahia (UFBa) e da Universidade do Estado da Bahia (Uneb). Isso porque se o STF julgar as Adins procedentes estará estendendo a decisão para todos os demais casos, resultando na extinção do sistema de cotas no Brasil.

A iminência de uma decisão tão vital me fez pensar na pedagoga que conheci ainda essa semana. Ela foi aluna da primeira turma de cotistas da UFBa, formou-se ano passado e hoje trabalha na coordenação pedagógica do Centro de Estudo Afro-Orientais da universidade, além de ensinar, em uma ONG, a meninas negras do ensino fundamental.

Diante de agurmentos pró e contra - por um lado de que o sistema de cotas é racista, e que de outro é emergencial enquanto não se qualifica nosso ensino médio e fundamental - as palavras dela foram iluminadoras. "Acho que as pessoas têm que se colocar no histórico de exclusão do Brasil. Elas devem execer seu papel de cidadão, de contribuir para diminuir a desigualdade. Não é uma questão pessoal, mas de toda a sociedade", disse.

Defendia, é claro, sua própria causa. Mas tomando-a como base, cabe a nós refletir sobre a nossa responsabilidade frente ao nosso legado histórico nas dimensões social, econômical e cultural. Vejo com frequência alunos que não conseguiram ingressar em uma universidade pública devido à reserva de vagas argumentarem que não podem pagar pela dívida histórica brasileira.

Olhando bem, é um pensamento extremamente elitista. De que a ordem socioeconômica em marcha nos últimos séculos, do mercantilismo incipiente à sua forma brutal neoliberalista, os colocou em posição de vantagem no processo de acumulação de riquezas, em consequência de aquisição dos materiais simbólicos. E isso, pensam os ingênuos jovens ricos e, na maioria, brancos, não pode ser  lhes retirado pelo mesmo Estado que os alçou a tal privilegiada posição.

Não vi e não vejo levantes das classes privilegiadas para exigir do Estado a melhora substancial da rede de ensino público brasileiro. Os alaridos só se fazem ouvir quando as políticas públicas atingem em cheio as benesses das elites. Concordo que devemos querer sim o fim do sistema de cotas, mas essa batalha não dever ser anterior à luta pelo resgate das escolas públicas. Que tal começarmos por matricular nossos filhos (futuros e existentes) na rede pública e fazer valer o peso de nosso poder aquisitivo em prol desse propósito?  


terça-feira, 2 de março de 2010

O kit do Brasileiro

Um amigo me passou por email uma daquelas mensagens de corrente. Não costumo lê-las, mas essa é desconcertante, toca na ferida, porque de forma sucinta e direta traz a verdade nua e crua. Ela segue abaixo, com algunas adaptações, pois não consegui transferir as imagens.

KIT DO BRASILEIRO



*Vai transar?*

O governo dá camisinha.

*Já transou?*

O governo dá a pílula do dia seguinte.

*Teve filho?*

O governo dá o Bolsa Família.

*Tá desempregado?*

O governo dá Bolsa Desemprego.

*Vai prestar vestibular?*

O governo dá o Bolsa Cota.

*Não tem terra?*

O governo dá o Bolsa Invasão e ainda te aposenta.

*Mas experimenta estudar e andar na linha pra ver o que é que te acontece!* 

Pagamento de IPVA, Imposto de Renda, ISS, IPTU, CPMF.

"Trabalhe duro, pois milhões de pessoas que vivem do Fome-Zero e do Bolsa-Família, sem trabalhar, dependem de você"

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

A "surra" de bunda

Não é de hoje que a bunda feminina faz parte de nosso patrimônio cultural. Mas o que se vê agora é a sua grande consagração. Das curvilinhas da garota de Ipanema, cujas delineações o belo bumbum não estava de fora da imaginação poética do maestro Tom Jobim, passando pelo famoso traseiro de Rita Kadilac, no programa de Chacrinha, como também pela retaguarda rebolativa de gostosas como Carla Perez, Tiazinha e Feiticeira, a nossa desejada bunda feminina se alçou de vez à posição de protagonista. Ganha vida própria para surrar os marmanjos de plantão nos bailes funks da noite carioca. Proponho o tombamento desses maravilhosos bumbuns... Veja o que "As Tequileiras" bundudas andam aprontando aqui.

domingo, 7 de fevereiro de 2010

Teste de HIV: Seu Carnaval pode terminar aí

Antes mesmo de começar a festa de Momo, já anteciparam ao Carnaval as ocorrências inusitadas que lhe são peculiares, como as irreverentes fantasias dos criativos foliões. A prefeitura anunciou na última semana que, durante a folia, ficará montado no Pelourinho, das 9h às 17h, de quinta-feira a sábado de Carnaval, um posto de saúde onde serão realizados testes de HIV e sífilis, cujos resultados saem em poucos minutos. A ação tem por objetivo conscientizar a população a realizar os exames de forma espontânea e imediata.

O projeto, com parceria do Ministério da Saúde, através da campanha do Departamento Nacional de DST/Aids, tem o sugestivo nome de "Fique Sabendo".  É no mínimo curioso o indivíduo  dar um tempo na algazarra momesca para saber, entre uma cerveja e outra, ou quem sabe entre uma "trepada" e outra, se está com a ficha limpa. A depender do resultado, a folia acaba ali mesmo: "Senhor, fique sabendo, o senhor é soropositivo". Fico imaginando uma notícia dessas em pleno Carnaval. 

A depender do teor alcoólico, ou mesmo do preparo psicológico para de uma festa entrar numa tragédia, a campanha  pode desencandear um revés, já que, segundo alguns,  na terrinha o ano só começa depois do Carnaval. Todas as obrigações ficam suspensas, imagine iniciar um tratamento contra, fique sabendo, contra a Aids.   

É isso aí, parafraseando Macaco Simões, esse é o Carnaval da piada pronta. Mas não esqueça de usar camisinha e, se por ventura, quiser conferir sua saúde sexual, vá até o 19º Centro de Saúde, no Pelourinho. A partir da adolescência, qualquer pessoa pode realizar o teste. Em caso de positivo,  haverá encaminhamento para serviço especializado. O acompanhamento e o tratamento poderão ser realizados nos serviços do SUS gratuitamente. A expectativa da prefeitura é de atender aproximadamente a 400 pessoas.

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

Ponte Itaparica: visão apaixonada demoniza projetos

Até às 23h30 de ontem, o abaixo-assinado contra a construção da ponte Salvador-Itaparica registrava 343 assinaturas. Entre elas, as de jornalistas, arquitetos e urbanistas baianos, e intelectuais nacionais de peso como Chico Buarque de Holanda, Cacá Diegues e Luís Fernando Veríssimo, e também locais, como Ruy Espinheira Filho, André Setaro e Roberto Albergaria. Não concordo com eles, que saíram em defesa da causa de João Ubaldo Ribeiro, que no artigo "Adeus, Itaparica", publicado em A TARDE em 25 de janeiro de 2010, lamentou uma das propostas de projeto da ponte apresentado pelo governo do Estado.

Os argumentos, na maioria, são legítimos, de que a ponte vai levar à Ilha um progresso depredador e elitizante, que além de acabar com a beleza natural e tranquila do lugar, vai acentuar um processo já em curso de degradação socioeconômica para o mercado local e seus habitantes. Outros argumentos são radicais, como o de que a ponte vai acabar com a beleza da Baía de Todos os Santos. Bem, a imagem aí em cima do que poderia ser o empreendimento quando pronto, ao meu ver, traz um bom visual a mais para a nossa majestosa Baía.

Trata-se do projeto do arquiteto Ivan Smarcevscki , realizado para a empreiteira OAS.  A construtora, segundo seu diretor na Bahia, Manoel Ribeiro Filho, irmão do escritor João Ubaldo, pretende construir uma ponte de 12 km, com seis a oito pistas, e um vão central de 500 metros de comprimento por 90 metros de altura, para permitir a passagem de embarcações. Além disso, a OAS pretende uma preservação rigorosa da contracosta, a criação de um Parque Estadual no Distrito de Baiacu (reserva de mata atlântica) e condomínios fechados na parte central da ilha, que já estaria “degradada sob o aspecto ambiental”. Essas informações foram dadas por Manoel à repórter Katherine Funke, de A TARDE.

É, sem dúvida uma prova de um claro interesse de expansão imobiliária na Ilha. Mas essa é apenas uma das propostas, outras estão em análise, segundo o governo. Não deverão ser lá tão diferentes,  visto que a Camargo Correia também anunciou intenção de empreender a obra.

Mas a luta contra a sede capitalista não pode, no entanto, abortar de antemão a construção da ponte. Sou a favor dela, porque ela pode levar desenvolvimento ao lugar, hoje um paraíso natural esquecido,  de difícil acesso por um deficitário sistema de ferry-boat, e estradas longas, e cuja população e turistas sofrem com a insegurança. Lembremos que os nativos são a favor do empreendimento.

Os argumentos do governo também não podem ser esquecidos. Segundo o secretário de Infraestrutura da Bahia, João Leão (PP), a ponte será uma nova entrada para Salvador, pelo lado sul da capital. O governo estadual visa também o escoamento pela ponte da produção de algodão, soja e outros produtos agroindustriais da região oeste do Estado. 

A discussão é salutar, se colocada sem radicalismos, para os dois lados, tanto os defensores de um naturalismo sem mudanças infraestruturais, quanto os progressistas do lucro fácil. Não seria a hora de fazer uma ponte entre eles para pôr em voga o conceito mais caro hoje ao mundo, o tal do desenvolvimento sustentável (real e efetivo, não aquele de faixada)? É preciso discutir as propostas com seriedade, sem discursos apaixonados.

quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

Marco Civil da Internet tem 800 contribuições de internautas

Estava lendo há pouco alguns do muitos e variados comentários que diversos cidadãos brasileiros, espalhados pelo Brasil, e pelo mundo, fizeram pela rede mundial de computadores acerca do Marco Civil da Internet, um processo de discussão pública virtual da regulamentação de nossos direitos e deveres na world wide web, que deverá ter como resultado um anteprojeto de lei a ser apresentado ao Congresso Nacional.

As primeiras discussões, promovidas pela Secretaria de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça através do blog Cultura Digital, foram realizadas entre outubro e dezembro do ano passado, e o primeiro relatório das propostas e debates foi disponibilizado este mês pela Secretaria, dividido em três eixos de discussão, em 576 páginas, abordando temas como Direitos Individuais e Coletivos na rede mundial de computadores.

A próxima etapa será, a partir destas sugestões, propostas e debates, realizar a primeira versão do anteprojeto que posteriormente será colocado em discussão pública, pelo blog, para a redação final do documento.

Não consegui ler ainda todo o relatório, uma compilação de nada menos do que 800 contribuições por escrito. Sobre Direitos Individuais e Coletivos, via a preocupação de nossos compatriotas internautas com o peso e medida de interferência do Estado sobre a liberdade e privacidade dos cidadãos na rede.

É interessante ver que talvez pela primeira vez neste País, como bem gosta de falar nosso carismático presidente (pelo menos que minha memória de 28 anos permita lembrar), um processo de normatização de matéria tão cara à democracia e à cidadania esteja, efetivamente, gozando de uma participação do povo.

É como se, grosso modo, e ainda de forma bem tímida, estívessemos passando da democracia representativa, de retornos pífios e ilusórios, para a democracia participativa, com reforço do sentimento de pertencimento e do senso de responsabilidade cívica.