sábado, 9 de abril de 2011

A família e os fatalismos inexplicáveis da sociedade

Um mar de hipóteses e suposições brotam pela sociedade, na imprensa e à boca pequena, sobre o que teria levado e o que teria permitido o jovem Wellington Menezes de Oliveira, 24, ter realizado o massacre da última quinta-feira, 7, na escola municipal Tasso da Silveira, bairro do Realengo, no Rio de Janeiro, matando 11 crianças e a si mesmo logo em seguida.  Entre as causas, as possibilidades e as explicações há abismos. E o problema que nos tira o chão é justamente saber o que fazer com eles.

Fala-se de um perfil psicológico típico de uma pessoa capaz de realizar tamanha atrocidade. Wellignton era solitário, tinha um discurso fundamentalista - tanto político, filosófico e religioso -, era rejeitado pelas meninas, teria sofrido bullying, e fazia da introspecção uma revolta crescente impossível de conter em determinado momento. Aborda-se a falta de segurança nas escolas como um ponto crucial, já que uma simples revista na portaria teria evitado a entrada do garoto em posse de dois revólveres. E, por final, ressuscitou-se o debate sobre o porte de armas de civis, pela facilidade com que Wellington adquiriu o armamento - alguns, como o jornalista Luciano Martins Costa, parecem querer creditar à sociedade um mea-culpa da tragédia, porque os brasileiros foram contra, em referendo de 2005,  ao desarmamento.

O que teríamos de soluções possíveis?  1 - Um acompanhamento psicopedagógico especializado e intensivo em todas as escolas do País, públicas e particulares, capaz de identificar e tratar perfis potencialmente "surto-criminosos". 2 - Estabelecimentos de ensino com seguranças armados, dotados de mecanismos de revista, manual e eletrônico. 3 - A ilegalidade irrestrita do porte de arma por civis em conjunto a um controle e fiscalização massantes dos registros e da circulação de armas no território nacional. 

Tudo bem. Mas algum dia a análise psicopedagógica pode falhar. O equipamento eletrônico pode quebrar e o segurança, como ser humano que é, esquecer de revistar alguém ou mesmo ser induzido a não fazê-lo. E, como as drogas, as armas podem continuar sendo obtidas na ilegalidade, por mais eficaz que seja o sistema de controle.

Trata-se então de uma fatalidade? Algo contra o qual a sociedade está de mãos atadas? O governador Wagner, falando anteontem à imprensa sobre a tragédia, colocou o problema no colo da família. "A gente tem que repensar os valores da família para refletir o porquê da banalização da violência", afirmou (em reprodução livre deste blogueiro, de memória, sem checar as anotações).

A família é a base organizacional da nossa sociedade. Por isso, concordo com o governador. Parece estar na família as pistas e chaves de entendimento das relações saudáveis e doentias que se formam no tecido social, capazes de formar Wellingtons, Pedros, Josés, Marias, Sennas, Ronaldos, Georges, Dilmas etc... Porque a família aparece como a unidade social que assimila, reproduz e reinterpreta todo o espírito de uma sociedade e os efeitos de suas ferramentas de coesão social (Estado, mídia, trabalho, para ficar nos principais da contemporaneidade).

Se os tempos modernos do individualismo, da forte competitividade, da meritocracia da plutocracia ou vice-versa, tem provocado tiros em Columbine, no Rio de Janeiro, em São Paulo (baiano que fez massacre no cinema), em Salvador (jovem que matou dois colegas de sala, no colégio Sigma em 2002) é sinal de que algo essencial de sua constituição aponta para bem mais do que uma explicação de particularidade psicológica somada a uma inércia do sistema de repressão e monitoramento dos comportamentos.

De uma certa forma, a sociedade abandonou a família à sua própria sorte, enquanto deposita nela todas as cargas e sobrecargas de seu desenvolvimento. Parece-me que os abismos vêm da sociedade para a família, até que esta nos conceda, nos rompantes, as grandes fatalidades. E a partir daí, ficamos sujeitos às explicações da psiquiatria.