terça-feira, 26 de julho de 2011

Tributo a Amy


Ouvi mais Amy Winehouse esses últimos três dias, após sua morte trágica, do que costumava escutar tempos antes. Na enxurrada de posts - áudios e vídeos - disponíveis na Internet, entristece-me a quantidade de registros de shows mostrando Amy como a sombra pálida dela mesma, um zumbi caricatural sem alma, roubada pelos excessos de toda sorte de entorpecentes, a ponto de nem seu talento assombroso poder recuperá-la.

O gênio Amy parecia ressuscitar alimentando-se das profundas feridas de seu espírito perturbado por uma tristeza depressiva. E todos, absolutamente todos - fãs, produtores, músicos, imprensa, familiares, amigos e médicos - sabiam disso. Era, como disse o crítico musical Nelson Motta, a crônica da morte anunciada da maior cantora do século XXI, até agora. 

Nada nem ninguém foi capaz de reabilitá-la. Amy disse não ao mundo e aceitamos de camarote sua derrocada, como se a genialidade fosse o passaporte para a autossuficiência. Mas não foi só uma interpretação equivocada, chegou mesmo ao sadismo. No Brasil, informaram os jornais, muitos foram aos show de Winehouse para vê-la "chapada", enquanto no Reino Unido, a imprensa sensacionalista se lambuzava com as atrapalhadas de uma famosa em decadência. 

No seio familiar, os pais foram incapazes de orientá-la. Não quero responsabilizá-los, mas um documentário exibido no Multishow mostrava o pai Mitchell Winehouse recebendo conselhos da psicóloga para não se culpar pelas barbaridades da filha. Já a mãe, Janis Winehouse, disse aos jornais, após a morte da cantora, que já se confomara há muito com o fim trágico, pois Amy "estava se matando". Pais não devem desistir dos filhos, ao menos no plano ético e moral, lembrando que olhar de fora sempre é muito mais fácil. 

Mas a ingenuidade sádica alcançou seu ápice pelas atitudes pouco compreensíveis, no prisma afetivo, da produção artística de Amy. Quando a artista negou-se a se internar numa clínica de reabilitação, seu produtor Salamm Remi estimulou a composição da canção Rehab, uma preciosidade para os ouvidos do mundo e um abismo ainda mais fundo para ela. E onde estava Remi quando permitia a esquálida,  frágil e alucinada Amy a subir no palco e expor aos holofotes canibais sua precariedade etílica e narcótica? As imagens da cantora branca de alma negra em um palco de Belgrado, na Sérvia, são de cortar o coração. Elas tornam factível algo quase impossível: tirar dos grandes artistas toda sua artisticidade, todo seu sopro de vida inimitável. 

Definitivamente, não se tratam gênios desse jeito.