quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Um voto mais que consciente

Acabo de ver na TV uma propaganda do Ministério Público Federal alertando para o absurdo de "vender" o voto em troca de mimos, favores ou empregos.  O anúncio televisivo simula um programa de auditório onde a participante do quadro tem que responder à seguinte pergunta do apresentador: a senhora opta por um hospital público novo ou uma dentadura?

A participante se encontra dentro de uma cabine da qual, presumo, ela não pode ouvir a pergunta lhe direcionada e deve, assim, respondê-la no escuro. É um esforço do MPF para demonstrar que a venda do voto é politicamente inconsciente e gera resultados catastróficos. Muito boa a iniciativa.

Mas da propaganda fiquei pensando. Até que ponto a "venda" do voto em troca de uma mínima dentadura, ou mesmo uns sacos de cimento, ou meses de cesta básica etc etc, é de fato politicamente inconsciente? Que é catastrófica, disso eu não tenho dúvidas. 

O brasileiro abaixo da linha de pobreza (hoje são 43 milhões nessa situação) olha para sua condição política  - quer dizer suas possibilidades dentro da pólis, da cidade, de quem tem renda suficiente apenas para comprar comida e os que têm menos ainda - e põe na balança se vota naquele candidato que lhe promete um hospital público ou naquele do saco de cimento, uma dentadura, uma cesta básica etc etc etc. Coisas que lhe chegam de pronto, diferente das promessas eleitoreiras deslumbrantes e, da maioria das vezes, inexecutadas. 

Parece-me bastante consciente. Tão quanto como à época da colonização portuguesa em terras tupiniquins, quando os índios, por muito historiadores considerados ingênuos, trocaram riquezas naturais, como o Pau Brasil, por bugigangas europeias, a exemplo de espelhos.  Para alguém que nunca havia se visto tão claramente, a não ser pelos reflexos pouco clarividentes dos espelhos d'água dos rios e lagos, conceder árvores, de que sua terra era farta, em troca de apetrechos tão sofisticados, era um grande negócio.

Na verdade, todos utilizam de seus recursos - o voto é um recurso democrático - para melhorar sua condição existencial, em nossos dias essencialmente política. Se há de prática ilegal ou imoral trocar o voto por um prato de comida, advirta àqueles que o negociam por um bom emprego.

Lembre que até mesmo jornalistas, ditos e autointitulados os tutores da democracia e do voto consciente, lembre que muitos deles em anos de campanhas prestam seus serviços, e sua consciência jornalística, portanto política, para esses mesmos políticos que não titubeiam em conceder uma dentadura enquanto prometem um hospital público novo. 

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