segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

O Aquecimento Global 3

Sem acordos concretos depois de uma semana de discussões em Copenhague, na Dinamarca, e ainda sem resultados das investigações da ONU sobre o "Climagate",  o mundo tem uma certeza, já clara e evidente, antes mesmo de os cientistas do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), criado em 1988, alertar as autoridades sobre os riscos ambientais de um sistema de produção desequilibrado, ou como em voga dizer, insustentável, calcado na revolução industrial e suas hoje 390 partes por milhão (ppm) de dióxido de carbono lançadas na atmosfera.

Confesso que estou ainda mais inclinado à dúvida do que à certeza sobre o aquecimento global ser uma tendência irreversível, ou mesmo se ele de fato tem causas antropogênicas. A dúvida ampara-se - diante da possibilidade para alguns cientistas de a Terra estar a caminho de uma nova era glacial - mais num questionamento existencial e filosófico do que em um refutamento baseado em fatos, já que a gama de informações sobre as mudanças climáticas disponíveis em larga escala seguem o caminho, que julgo de honrosas motivações, a despeito de qualquer interesses escusos possíveis, da ratificação irrefutável do fenômeno em questão.

Em breve passeio na blogosfera hoje, li, inclusive, uma discussão de leitores do blog Laboratório, de jornalistas da editoria de Ciência da Folha de São Paulo, na qual os internautas, indignados, questionavam por que revistas de publicação e divulgação científica, como a Nature, estavam barrando os artigos de cientistas que contestam a tese do IPPC e defendem o aquecimento como um fenômeno natural. Para os jornalistas do blog, as revistas refutam os artigos porque eles não se valem de dados científicos bem embasados.

Diante da celeuma, também um mundo de incógnitas. E se os cientistas contrários à tese do aquecimento global estiverem certos e a Terra por ventura entrar em uma pequena era glacial? Estaremos, os humanos, em frente ao colapso de todas nossas crenças e teorias, do Criacionismo à Gaia, de James Loverloock. Quer dizer, restará cair em si de que não somos tão especiais, seres da luz da racionalidade, capazes de dominarmos a natureza; de não estamos no comando, mas alheios e vulneráveis a uma força maior e indomável. Do outro lado, por que acreditarmos em alguns cientistas, contrários à maioria esmagadora, cujas teorias podem ser utilizadas pelos senhores do capitalismo para reforçar um modelo de produção injusto e cruel que coloca na linha de pobreza bilhões de seres humanos em favor de confortos e idiossincrasias injustificáveis num entendimento coletivo?

Em meio a tantas questões, é hora, creio, de apegar-se ao que temos certeza. Precisamos de um novo modelo de produção, mais justo, que supra as necessidades vitais e sociais de toda humanidade por gerações e gerações, e isso não é possível sem que criemos uma produtividade duradoura e harmônica com a natureza, preservando as fontes de energia. Mesmo que um dia nossa espécie seja extinta pelos revesses da Natureza, da qual somos mais um exemplar. 

sábado, 19 de dezembro de 2009

Então é Natal...




Um dia Millôr Fernandes, em uma das suas crônicas, afirmou que jà não se podia escrever mais nada sobre Natal, pois tudo o que se poderia já fora escrito. Tem razão. Desde as reflexões do arrastão consumista, as imensas desigualdades sociais, o espírito de solidariedade, o encontro familiar de pessoas estranhas, até o cunho de rejuvenescimento religioso e espiritual ligado à data. Não sobram ideias ou palavras para reinventar as cores e luzes natalinas.

E por que então o Natal? Por que este encantamento, este movimento de pessoas de procura mútua? O estímulo econômico, a grana extra do 13 salário, trabalha em favor da autoilusão a que todo ser humano caminha como artifício de superar as agruras e dificuldades da vida como ela é. O Natal é assim o momento de pintar a realidade com tons de cor mais amenos e gentis. Daí a solidariedade como regra, o congraçamento como objetivo.

É também o momento de cultivar a necessidade do homem de estar junto, de fazer parte, de exercer o sentido de pertencimento, embora nosso sistema produtivo possa trabalhar a favor do processo de isolamento, introspecção e recalcamento.

E assim, acolhido por nossos pares, presenteados ou não, afinados ou não, paramos para reingressar nas vidas cotidianas, com mentes frescas e mais esperançosas, acredito. Feliz Natal!

quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Contra um jornalismo tecnófilo

Tenho lido um pouco, ultimamente, sobre as relações entre as novas tecnologias de comunicação (NTC) e jornalismo. Tenho notado que tem se colocado em superevidência as mudanças que as NTC têm trazido e podem trazer para o campo jornalístico, em detrimento de princípios essencias da atividade profissional.

No meio do ano, salvo engano, um grupo de estudantes de Jornalismo da UFBa, entrevistou-me, e também outros jornalistas, sobre a rotina de produção da notícia. Ficaram estarrecidos - foi a impressão que me passaram - quando descobriram que até aquele momento eu não utilizava o Twitter, a mais nova entre as redes sociais constituídas dentro da rede mundial de computadores, a internet. Há dois meses, tornei-me um "twiteiro" e, cá para nós, ainda não consigo assimilar o porquê do estarrecimento daqueles estudantes, um tanto tecnófilos, parece-me. A tecnofilia,  na verdade, tem sido um mal para o jornalismo, fruto de um entendimento equivocado da relação entre a atividade jornalística e as novas ferramentas tecnológicas de comunicação.

Vou me ancorar no claro pensamento do experiente jornalista Ricardo Kotscho, apresentado em seminário de comunicação promovido pelo Banco do Brasil em novembro de 2007. Uma conclusão de Kotschö: "Em resumo, as novas tecnologias não ajudaram a melhorar a cultura jornalística. Ao contrário, estimularam a preguiça, a 'editorialização' do noticiário, a mesmice, o 'opinianismo". Outro dia, vi um post no Twitter que comemorava o fato de um técnico de futebol, que agora não lembro o nome, ter anunciado no Twitter sua saída de determinado time.  Significava que muitos leitores já tinham a informação antes mesmo de ela virar notícia na imprensa. Algum jornalista, antenado na rede social, leu a informação e a declaração caiu na chamada grande mídia.

É salutar à democracia que o Twitter, como outras espécies ou gêneros de NTC, possibilite a quebra do monopólio da produção e distribuição de informação. No caso, o técnico dispensou os jornalistas e foi direto, por assim dizer, à audiência.  A questão, no entanto, é que, diferente dos demais "twiteiros", os jornalistas têm a obrigação e o lugar de fala necessário para extrair da fonte informações mais detalhadas sobre o fato e o dever de contextualizá-las. Não poderá nunca se deixar restringir pelos limites de apuração dados pelos instrumentos tecnológicos disponíveis, sobretudo quando estes prometem um falso alcance de diálogo com a fonte.

Infelizmente, esse é o problema maior do jornalismo contemporâneo. Ele virou servo da velocidade de comunicação que as NTC hoje tornam possível. Como bem observou Kotscho, ao invés de usarmos a tecnologia a favor da qualidade e conforto de produção da notícia, incorremos no processo contrário. Temos, cada dia, menos tempo e menor autonomia para noticiar. O resultado são noticiários padrão, e pouca profundidade das matérias, e, pior, a falsa percepção de que as novas tecnologias exigem alterações essenciais do modo de fazer jornalismo, quando na verdade são ferramentas a mais ou leiautes diversos. O que diferencia uma chamadinha noticiosa de quatro palavras registrada em um bilhete e divulgada via celular? O alcance espaço-temporal de divulgação. Essa é a diferença. Mas para produzí-la precisou-se de avaliar o interesse público inerente, a precisão da informação e a fidedignidade com que foi publicada.

É claro, voltando aos estudantes, que o estarrecimento deles têm razão de ser. Não é razoável a um jornalista negligenciar um mundo de potencial fontes que lhe é possibilitado pelo Twitter e por outras redes sociais. Por isso, tornei-me membro. Entretanto, tal estarrecimento não afasta meu espanto em oservar que a preocupação deles com a relação jornalismo e tecnologia quase neutraliza e elimina relações bem mais imporantes como jornalismo e política, jornalismo e economia, e destas todas com tecnologia. Nenhum deles jamais ouvira sequer falar de Milton Santos (e eu confesso que sei muito menos do ilustre geógrafo do que deveria e gostaria), intelectual que ressalta a importância do entendimento dos diálogos entre a política e o estado da técnica para a compreensão da história. Por isso, eles pareceram-me tecnófilos, de compreensão irrefletida de um jornalismo igualmente tecnófilo, realizado da forma menos proveitosa.

domingo, 13 de dezembro de 2009

Cresce inclusão social no País

O Brasil é um país de abissais desigualdades sociais. Os últimos números socioeconômicos, no entanto, anunciam um processo de maior inclusão das classes menos favorecidas, o que indica, ainda timidamente, que a nação tupiniquim está evoluindo do que pode ser chamado de um capitalismo selvagem, altamente excludente, para o que alguns chamam de capitalismo social.


O acesso à rede mundial de computadores, a internet, subiu de cerca de 20% em 2005 para algo em torno de 35% em 2008, segundo dados do IBGE. É ainda muito pouco, quando mais de 100 milhões de brasileiros ainda não estão conectados ao instrumento considerado de maior potencial democrático. Por uma outra perspectiva, é significativo mais de 20 milhões terem sido incluídos na web em três anos. Seguindo essa projeção, no ano da Copa do Mundo no Rio de Janeiro, estaremos chegando à cifra de 100 milhões de brasileiros internautas.

Outra boa notícia diz respeito ao poder de compra das classes C, D, E do Norte e Nordeste. Entre setembro de 2008 e o mesmo mês deste ano, elas consumiram mais do que as classes A e B das regiões Sul e Sudeste. Crédito fácil e valorização do salário mínimo explicam o fenômeno. Em consequência, como reflexo positivo, as empresas "descobrem" outro filão para expansão das vendas.

Em suma, os menos ricos passam agora a ser termômetro de uma democracia de mercado, porque mais incluídos substancialmente nela.

quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

A falácia do aquecimento global 2

Nos primeiros dias da convenção internacional sobre o aquecimento global, em Copenhague, na Dinamarca, as notícias sobre as discussões do evento destacaram a informação de que, segundo a Organização Mundial de Metereologia (OMM), ligada à ONU,  a última década, entre 2000 e 2009, foi a mais quente desde 1850, quando se começou a medir oficialmente as temperaturas do globo.

Os ambientalistas comemoraram, retrucando contra os "céticos" do aquecimento global, estes que questionam o fenômeno de aumento da temperatura da Terra. Bem, recorro novamente aos argumentos do cientista Luiz Carlos Molion, diretor do Instituto de Ciências Atmosféricas da Universidade Federal de Alagoas, para invocar mais cautela diante dos discursos homogêneos sobre o grande problema ambiental do mundo. Molion coloca em xeque a relação direta entre emissão de CO2 e aumento da temperatura. Escreve o cientista em artigo: "... o aumento da concentração de CO2 na atmosfera não comanda a temperatura global. Sua contribuição ao efeito estufa atual é estimada em 0,12%, de acordo com o documento Global warming: a chilly perspective (Aquecimento global: uma perspectiva gelada). Ou seja, o CO2 não é um controlador importante do clima global".

Se a Terra esta esquentando, pode ser que a causa esteja ligada a um ciclo natural de mudanças de temperatura e consequemente climáticas do globo. O que está em questão é a credibilidade  e a precisão dos dados sobre o aquecimento global, para que oportunistas defensores de grandes conglomerados econômicos não se valham nem, de um lado, do discurso ambientalista radical, nem, de outro, da retórica desenvolvimentista predadora.

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

A falácia do aquecimento global

Ainda na faculdade, ano de 2005, se não me engano, fui olhado com estranheza por uma plateia de estudantes ao perguntar ao repórter Zé Raimundo, da TV Bahia, jornalista de muita familiaridade com o tema ambiental, se ele acreditava no aquecimento global e o que achava da opinião de cientistas que contestam a tese do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), da ONU, a exemplo do brasileiro Luiz Carlos Molion.

Escreve o cientista em dos seus artigos (disponível aqui): "O Planeta se aqueceu mais rapidamente entre 1925-1946, quando a quantidade de CO2 lançada na atmosfera era inferior a 10% da atual, e se resfriouentre 1947-1976, quando ocorreu o desenvolvimento econômico acelerado após a Segunda Guerra Mundial. Dados dos MSU a bordo de satélites não confirmaram um aquecimento expressivo pós-1979, que é aparente na série de temperatura obtida com termômetros de superfície".

Agora as suspeitas de manipulação nas informações divulgadas pelo Painel reforçam a tese de que o discurso de aquecimento global para explicar toda e qualquer modificação desastrosa na natureza - escondendo-se assim os problemas ambientais reais - nada mais é que um forte argumento para as empresas movimentarem rios de dinheiro com a economia verde (um mercado hoje acima de US$ 1 bilhão). Nada contra, mas a sustentabilidade deve ser real e não manipulada para encher o bolso de "ecodólares".

De volta ao painel de Arruda

Acabo de ler um post do jornalista Carlos Castilho no seu blog Código Aberto sobre a indiferença com que o público recebeu as nóticias do escândalo do propinoduto do governador José Roberto Arruda (DEM). Acho que a indiferença não resulta apenas de um cansaço do leitor frente a este sistema lógico repetitivo da mídia em retroalimentar-se de fatos fáceis e potencialmente espetaculosos, como Castilho aponta.

Penso que se deve muito, talvez preponderantemente, ao personagem central do escândalo. O governador do DF, que agora deve enfrentar um processo de impeachment, é uma figura conhecida da banda podre do nosso já comprometido ambiente político. Basta voltarmos míseros nove anos atrás e lembrarmos de Arruda, então líder governo no Senado, saindo pelas portas dos fundos, renunciando para escapar do processo de cassação, por envolvimento com a fraude da votação do painel do Senado, o conhecido escândalo do painel.

A impressão que fica agora é de quem não votou em Arruda para governador deve está falando por aí "ainda bem que não votei nele". E aquele que votou: "eu sabia...se arrenpendimento matasse!". Daí, a indiferença, se é que deu para entender. A história penaliza os que não se valem da memória.

Mais um lugar a menos

Há quase cinco meses, escrevi neste modesto blog sobre "o atendimento sem volta", a respeito de dois locais onde prometi jamais colocar meus pés de volta, depois de ter considerado o atendimento muito ruim. Bem, a lista cresceu e diminuiu, se isso é possível. Numa recaída, outro dia voltei à livraria Siciliano. Explico-me: os livros que procurava não foram encontrados em sebos, e cada dia tem-se menos livrarias de porte na cidade - a Civilização Brasileira, no Iguatemi, por exemplo, fechou as portas. Da próxima vez, vou ter mais paciência e fazer minhas compras na internet, onde as opções são bem melhores e variadas.

Mas a lista também aumentou, pelo ramo dos locais onde bater um rango. Era cliente assíduo da lanchonete Cometa Açai, na Rua Goiás, Pituba, até a semana passada. A história. Cheguei ao caixa, cumprimentei o funcionário e fiz meu pedido, um simples suco de laranja. Passaram-se 10 minutos. Como estava, de cabeça abaixada, operando no computador, o atendente permaneceu. Mais quase 10 minutos e nada. Impaciente, minha namorada questionou: "tem alguém para atender a gente ou tá difícil? A gente pediu há um tempão um suco de laranja". Só aí, o educado funcionário resolveu registrar o nosso pedido e checar se ainda havia laranjas na casa para fazer o suco. Caramba! E não havia laranjas.

Reclamei do atendimento relapso e fui obrigado a ouvir a ironia de um segundo funcionário: "é brother, o atendimento tá ruim né? O camarada estava terminando uns serviços". Bem, disparei um "imbecil", virei as costas e fui embora, para nunca mais voltar. E agora é fácil, porque lugar onde comer que não falta.

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Iraque "invade" You Tube - A luta pelo espaço da informação

O primeiro a ter notoriedade pelo bom aproveitamento político na Internet foi o atual presidente dos EUA, Barack Obama. Inclusive, pela perfomance no mundo virtual, ganhou à época do pleito yanque a alcunha de candidato 2.0. Depois, mais recente, veio a Petrobras, com uma página na web onde responde diretamente às interpelações da imprensa, no intuito de driblar os filtros interpretativos da mídia, indo, assim, direto ao público.

Agora é a vez do governo do Iraque. O primeiro ministro Nouri Al-Maliki lançou ontem um canal oficial iraquiano no You Tube, com o objetivo de desmentir "as mentiras da mídia". O canal, curiosamente, não permite aos usuários fazer comentários, como se pode checar acessando a página. O vídeo com o primeiro ministro anunciando  o novo canal do governo recebia até às 00h55 de hoje 4.665 visitações.

Leva a refletir como a Internet, considerada por muitos a ferramenta crucial para democratização da informação, tal comos os casos Obama e Petrobras fazem crer, pode acolher usos aparentemente não tão democráticos assim. Levou-me a pensar também que a rede mundial de computadores restringe-se a uma mera ferramenta, e não pode ser vista como um organismo político e social vivo, autônomo e independente, capaz de se transformar na fonte de informação prima. O que, portanto, lhe exime da obrigatoriedade de provocar reviravoltas macro.

Extendendo a questão a outras utilizações da mais moderna ferramenta de mídia, a exemplo das redes sociais (Twitter, Facebook, Orkut), vale ressaltar que a hegemonia da produção de informação, embora aclame-se pelos quatro cantos a liberação do pólo emissor, continua nas mãos das grandes corporações de mídia, as quais, inclusive, invadem cada vez mais esses espaços inicialmente alternativos e fagocitam os meios e produtores independentes que ganham alguma notoriedade, caso do próprio You Tube, hoje propriedade da Google.

É uma luta por espaço ainda muito desigual. E daí, e por outros tantos motivos, milhares de leitores conectados na rede não se informarem através de outros produtores (até porque é custoso produzir informação genuína, de qualidade, e que inspire credibilidade). Os blogs de grande audiência acabam por quase invariavelmente parar na midiaesfera, saindo assim de seu espaço original, a blogsfera, só para ficar neste exemplo.

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Jornalista desmistifica o pensamento positivo

"Abaixo a ditadura do pensamento positivo". Esta é uma das frases mais inteligentes ditas recentemente no mundo. É da escritora e jornalista americana Barbara Ehrenreich, 68, entrevistada pela repórter Maíra Magro, na última edição, dia 18, da revista Istoé. Após enfrentar um câncer, quando recorreu aos livros de autoajuda, Barbara chegou à conclusão de que o pensamento positivo é um engodo que, superexplorado pelo mercado, aliena as pessoas, podendo muitas vezes prejudicá-las, ao invés de ajudá-las.

Vale a pena ler a entrevista. Mas um trecho esclarece de forma inequívoca aonde mora o perigo deste positivismo que varre o mundo hoje: "Estamos acostumados a ouvir que, se pensarmos positivamente, as coisas boas virão. Muita gente pobre ouve isso nas igrejas evangélicas: Deus quer que você seja rico, Deus quer que você tenha uma casa maior. E aí, se alguém lhe oferece uma hipoteca que pareça milagrosa, que você não tenha que provar renda ou pagar uma valor de entrada, isso é visto como uma benção".

Isso vale para pessoas mais esclarecidas, muitas que viram como uma novidade hiperrevolucionária as baboseiras do livro e vídeo "O Segredo". A cada comentário sobre o best seller eu me perguntava: "Será que é preciso tamanho estardalhaço para dizer que precisamos acreditar em si mesmos?" Incomodava-me ainda ver serem vendidas ideias de que você pode ser e fazer tudo, basta acreditar e pensar positivo para o universo conspirar a seu favor. Que idiotice mais absurda!

Bom, agora estou sossegado. Alguém também pensa que o segredo não existe, mas sim a vida como ela é, para nos brindar com linhas bem realísticas e inimagináveis que este mundo nos traz, como já retratava o saudoso Nelson Rodrigues.

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Ladrão virtual: sujeito inexistente 2


Domingo, 15 de novembro de 2009. Por volta de 13h30, eu e minha namorada Verena nos dirigimos ao caixa eletrônico do Bradesco, um quiosque localizado em frente ao Shopping Itaigara. Queria fazer um saque. Dentro do quiosque, Verena observou que o painel estava visivelmente afundado. Passou a mão pela brecha deixada e tocou um fio estranho. Desconfiados de algum golpe, não iniciamos a operação. Agachei-me e verifiquei a presença de uma microcâmera conectada por um fio a um aparelho, o que em princípio parecia ser um celular,  mas depois se revelou um MP4 da Sony.

Bingo! Algum filho da mãe instalara equipamentos eletrônicos para capturar os momentos que os usuários ingênuos digitavam suas senhas. Várias vítimas devem ter sido surrupiadas pelo ladrão virtual. Algumas foram poupadas naquele início de tarde dominical graças a um casal calejado, observador e solidário. Eu, no caso, faço parte dos dois tipos de vítima: a consumada e a potencial.

Bingo, mais uma vez! No domingo anterior ao feriado de finados, estive no bendito quiosque verificando meu saldo. Não recordo, por desatento, se o painel já estava afundado à época. Mas tudo indica que o bandido, esse sem nome, conseguiu ali meus valiosos códigos bancários. Feita a dedução, chamei a polícia militar e registrei queixa na 16 Circunscrição Policial (Delegacia da Pituba). O aparelho foi apreendido e deve passar por perícia.

Mera formalidade. "Isso só em seriados americanos", disse-me uma agente policial após eu questioná-la da possibilidade de se chegar aos meliantes virtuais a partir das digitais impressas no MP4. Até porque, pasme, o caixa eletrônico, fora o do ladrão, não conta com sistema de câmera. Tudo bem, pelo menos cumpri meu papel de cidadão.

E, sem esquecer, meu rico dinheirinho, os R$ 780 roubados, já voltou à minha conta, agora sob nova senha, é claro. Ainda que, "por mera liberalidade", como versa o instrumento de ressarcimento do banco, o Bradesco resolveu cobrir meu prejuízo e depositar minha grana.

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

Caetano faz comparação descabida

As declarações de Caetano Veloso sobre o presidente Lula hoje, além de deselegantes e desnecessárias, não esclarecem o que ele de fato quis dizer com "Marina é Lula e é Obama ao mesmo tempo. Ela é meio preta, cabocla e inteligente como o Obama. Não é analfabeta como o Lula, que não sabe falar, é cafona falando, grosseiro. Ela fala bem". Se o jornais não cortaram o restante da frase, ficou faltando um tanto de coerência para o artista.

Em que sentido e características Marina é Lula, já que ela possui o dom da palavra, enquanto o presidente, segundo Caetano, tropeça na retórica? Não tenho a mínima ideia. Marina está longe de ser Lula, embora tenha como ele uma trajetória de uma pessoa que saiu da miséria e da ignorância para entrar no rol das grandes personalidades mundiais. Não tem e muito dificilmente terá uma carisma de tamanha dimensão do presidente ou mesmo a habilidade política do ex-sindicalista e ex-petista Luís Inácio, que de tão preponderante, forja a passos rápidos outra matiz ou linha política no Brasil, chamada por cientista políticos de lulismo.

Marina tem um quê de radicalismo bem parecido com a verborragia de Heloísa Helena, por um lado superpositiva como resistência e destituição de práticas oligárquicas patrimonialistas bem em vigor ainda no País, e de outro hipernegativas, por trazer o risco de colocar a perder um equilíbrio de forças capaz de manter o Brasil no rumo do desenvolvimento econômico.

Em tempo, voltando à delegância de Caetano, houve jornalistas que defendesse o compositor, ressaltando que o cantor teria usado de sua inteligência para dá peso à campanha de Marina, e o endossasse nas críticas ao presidente, já que Lula seria um ser desprovido de erudição e conhecimento. Engraçado, um jornalista, que deveria ter uma sensibilidade inteligente, consegue dizer tamanha burrice, pois confunde cultura escolástica com inteligência, uma não resulta necessariamente a outra. Este jornalista não consegue perceber ou admitir uma inteligência tão loquaz como a que Lula adquiriu com as dificuldades da vida e com os contratempos e sobressaltos da política (vale ler o texto de Eugênio Bucci sobre o gênio Lula).

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

Ladrão virtual: sujeito inexistente

O mundo virtual tem umas peculiaridades um tanto excêntricas. Pode-se estreitar relações entre pessoas a priori conflituosas, como o jornalista Carlos Castilho noticiou recentemente (ver texto abaixo); pode-se encontrar amigos que há muito tempo não se via, como acontece no Orkut; pode-se expor ideias em potencial acessíveis a um mundo de espectadores inimaginável, em escala planetária, como se faz pelos blogs e pelas redes sociais. As possibilidades são incontáveis. Até aí nada de anormal.

Entretanto, confesso-lhes que tal dinâmica, constituída de uma fluidez informacional que suprime tempo e espaço, me tirou do sério hoje. Pela primeira vez, como milhares de outras pessoas, me apercebi que de um dia para outro um fulano, beltrano, ou, com devida licença, um filho da puta mesmo, levou-me cerca de R$ 800, simplesmente sacando meu rico dinheirinho da minha conta, do meu cofre virtual, como queiram. Ainda não tive a confirmação do banco, mas tudo indica que fui vítima de clonagem.

Disso resultam raiva, perplexidade, indignação e, sobretudo, impotência, diante de tamanha excentricidade. Nos tempos da era da informação digital, um inocente roubado perde absolutamente a oportunidade de conhecer o seu algoz, de ao menos suspeitar de quem ele seja, e em última instância ou, vá lá, de primeira mesmo, para os mais reativos, de sapecar-lhe uma boa surra.

Já ouço quem defenda, sustentando-se na natureza virtual de tal fenômeno, uma maior segurança dos vitimados, já que eles deixam de cair na tentação de brigar com o ladrão e acabar perdendo a vida. Na verdade, bons defensores, tenho de concordar com a análise. O larápio moderno, ou melhor, contemporâneo, pode ter a fineza de roubar sem nos machucar, sem nos constranger física e moralmente. Sou capaz de quase ouví-lo pedir licença antes de utilizar seu cartão, na verdade o meu, digitar calmamente a senha de seis dígitos, e assobiar tranquilo enquanto pensa no valor a ser sacado. De até imaginá-lo (mas quem?), após realizada a operação, sair calmamente da agência, sem pesares, com a grana no bolso.

Ele é esse não sei quem, esse sem nome, esse sujeito inexistente, esse humano virtual (no sentido de vir a ser) que nunca nos será atual, ao menos que tenhamos a sorte da câmera do caixa eletrônico ter o filmado, ter a chance de o banco nos permitir ver as imagens, e de a polícia um dia prendê-lo.  Cá pra nós, eu queria mesmo era ter podido dar-lhe um bons murros e pontapés, enquanto ele passava a mão na minha carteira.

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

Conversas Impossíveis

O jornalista Carlos Castilho, uma antena ligada aos usos, possibilidades e impactos das novas tecnologias no mundo, publicou hoje um artigo superinteressante no site Observatório da Imprensa. Ver aqui. O texto traz notícias de uma dimensão assustadora, por impressionante, que as redes sociais estão atingindo, rompendo com fronteiras de outro modo intransponíveis.

Agora, pelas redes ou pela blogosfera, veem-se extremistas conservadores e radicais, do âmbito religioso ao político, trocarem figurinhas com um suposto objetivo ainda muito especulativo de estabelecer um diálogo amistoso que leve a soluções de conflitos delicados e consequentemente à paz. Escreve Castilho: "O potencial da Web para integrar horizontal e descentralizadamente comunidades sociais em conflito mútuo está tornando cada vez mais frequentes e intensos os chamados diálogos impossíveis pela internet, como o que está sendo travado via blog por uma especialista australiana em antiterrorismo e um dos principais artífices da estratégia Taliban, a guerrilha afegã que hoje é a principal dor de cabeça dos Estados Unidos no mundo".

Sem dúvida, é um fenômeno no mínimo curioso, cujos efeitos práticos são ainda impossíveis de mensurar.

quarta-feira, 21 de outubro de 2009

Carros, carros, e as pessoas?


Salvador possui hoje mais de 600 mil carros circulando por suas vias urbanas. Estima-se que a cada dia ingressem nas ruas soteropolitanas mais 5 mil automóveis particulares. Como costumam ironizar os arquitetos e urbanistas, existe fábrica de carros, mas não indústria de avenidas e vias expressas. Quer dizer que estamos caminhando para o colapso, tal qual vive hoje a megalópole São Paulo, com seus engarrafamentos de até 200 quilômetros. E não adianta construir mais vias, porque quantos mais ruas mais carros teremos as ocupando, vide a cidade de Los Angeles, planejada para o automóvel individual, com centenas de viadutos e "express ways", hoje imersa em um trânsito caótico.

Está aí o problema gritante de mobilidade urbana, o qual só será resolvido, convergem especialistas, com investimentos substanciais em transporte urbano de massa - coisa muito diferente do nosso "ferrorama" de 13,5 km, o menor metrô do mundo. Mas o desafio mesmo é mudar as cabeças das pessoas, de uma classe média elitista acostumada a desfilar seus carrões pelas ruas e de uma categoria emergente que vê agora, diante de uma política nacional de incentivo ao consumo de carro (redução do IPI foi uma mão na roda literalmente), a possibilidade de galgar o status e o conforto da invenção do alemão Karl Benz popularizado pelo americano Henry Ford, com sua produção em série.

Cá com meus botões, fico imaginando como as pessoas vão deixar de usar seus carros, no seu ambiente particular e privado, ao conforto de um ar-condicionado e som a gosto, para caminhar pelos passeios estreitos da cidade, sob sol a pino, e tomar um buzão, com capacidade para 180 passageiros. É que a prefeitura está apostando no chamado Bus Rapid Transit (BRT), ou "metrô sobre rodas" deslocando-se através de corredores excluvisos pelas principais avenidas de ligação da cidade (Paralela, Vasco da Gama e ACM) para tormar mais eficiente o sistema público de transporte coletivo. Na verdade, fala-se também de caríssimos pedágios urbanos para desestimular o uso do carro - tal como acontece hoje no centro comercial de Londres - como medida de uma política de restrição de uso do automóvel particular.

Eu tenho lá minhas dúvidas. Contagiados e alienados por uma tecnologia política do corpo - para abusar de um termo foucaultiano - socialmente capitalista, direcionada a um consumo de culto ao individualismo exacerbado, a elite provinciana e o proletariado burguês soteropolitanos não vão arredar fácil de deixar seus carros nas garagens, em nome de uma mobilidade urbana saudável. A cabeça destes terceiros mundistas, temo, irá alçar ao posto de alto status aquele cidadão que, ainda sob um custo altíssimo, puder desfilar com seu automóvel último modelo e, sobretudo, pagar pelo vultoso preço do estacionamento.

Espero que eu esteja errado. Seria altamente gratificante ver uma cidade onde as pessoas circulam pelos passeios, onde os meios de transporte tornam-se meio de sociabilidade e encontro (não de insegurança, desconforto e ateste de excluído social, como hoje), e esquecer, deixando para um passado superado, que os automóveis particulares foram um dia símbolo de pujança econômica ao mesmo tempo que isolavam as pessoas do mundo, dos seus concidadãos, de seu espaço público, de sua cidade.

sábado, 17 de outubro de 2009

Mídia negativa: espelho de uma racionalidade burra

Há um sem número de acontecimentos cobertos pela imprensa que trazem aos leitores e espectadores um mundo de poucas gentilezas, cordialidades e gestos de boas-vindas. Seja internacional - com as notícias do "barril de pólvora atômica" do Oriente Médio, os testes nucleares da Coréia do Norte ou a venda de terras da África a preço de banana -, seja nacionalmente, com as noticías da guerra entre policiais e traficantes (hoje no Rio de Janeiro, os bandidos simplesmente derrubaram um helicóptero da Polícia Militar), seja no local, com as notícias de traficantes atentando contra o patrimônio público ou um juiz matando um motociclista por simplesmente ignorar o bom senso e as regras de trânsito.

Desculpem-me os eventuais desinformados por não detalhar cada notícia citada, por presumir que à esta altura poucos não tomaram conhecimento deste mundo de garras afiadas. Na verdade, o que interessa neste texto é perguntar-se: quem somos nós, estes animais, que creditam a uma racionalidade o privilégio de serem chamados "filhos" de um suposto ser divino criador do Universo ao qual foi dado o nome de Deus? Bem, diante deste mundo pouco gentil e cortez, só três conclusões precipitadas me ocorrem: Deus não existe; Deus renegou seus filhos; nunca fomos ou seremos os filhos de Deus.

Na verdade, a reflexão deve ser bem mais profunda. A racionalidade humana, ostentada como o diferenciador essencial entre nós e o resto dos animais, de tão burra e irracional consegue fazer com que construamos um mundo humano tendente a mais tragédias e a menos dádivas. Daí porque tantos atos estúpidos - que alguns, por ainda creditarem à razão a salvação do homem, qualificam-nos de desumanos ou irracionais - preencherem nossa vida cotidiana e daí porque na mídia tamanha barbárie ser prioridade dos noticíários. O homem não só se automutila como precisa ver para acreditar que tal fenômeno de autodestruição lhe é intríseco por mais racionais se arvorem em ser.

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

Olímpiadas 2016: uma oportunidade

Depois do anúncio do Rio de Janeiro como a escolhida pelo Comitê Olímpico Internacional (COI) para sediar as Olímpiadas de 2016, um festival de loas ufanistas e patrióticas e uma saraivada de ponderações com tons céticos, sim, mas um tanto pessimistas, tomaram os meios de comunicação de massa Brasil afora.

Entre aqueles mais "pés no chão", digamos, predominaram as lembranças de uma cidade tomada pela criminalidade (organizada ou desorganizada) nos morros favelados; dos megaempreendimentos hoje elefantes brancos do legado panamericano; ou ainda dos superralos de onde os grandes investimentos, algo em torno de US$ 11 bilhões, podem escoar para bolsos sabe lá de quem, desde empreiteiras, lobistas a políticos.

Do outro lado, os patriotas tupiniquins encantados com as possibilidades de desenvolvimento que um evento olímpico pode proporcionar para a cidade e ao País, seja desde a despoluição das águas da Baía de Guanabara até o incremento econômico - uma grande leva de turistas chegando ao Rio e outras cidades-pólo do Brasil, e a circulação de dinheiro (segundo economistas, cada real investido pode gera cinco vezes mais de riquezas).

Vai do bom senso, sobretudo para críticas desta natureza, fazer observações mais ponderadas. Por um prisma, o patriótico, não se pode esquecer, e não acredito que seja o caso, dos enormes desafios que a estruturação para uma Olimpíada exige. Claro que, mediante o volume de dinheiro em jogo, a realização dos jogos deve se converter em desenvolvimento social de uma longevidade razoável, escapando-se do desperdício do erário público, da locupletação pólítica, e do desvio de verbas. Pela visão pessimista, é descabido pensar que os problemas de violência e desigualdade social do País inviabilizem a Olimpíada.

O fato de sermos a 10ª economia do mundo e o 75º em desenvolvimento humano (IDH) só reforça a ideia de que realizações de grande monta econômica devem ser transformados em benefícios sociais à população, mas de modo algum evitados, sob o argumento prévio de que serão mal explorados, devido a interesses particulares da minoria. Seria o mesmo que dizer que devemos parar de crescer, porque as "fatias do bolo" nunca são igualmente distribuídas. Tal pensamento é provinciano e encobre, sob pretexto de uma precaução pseudocrítica, as possibilidades que um evento de tamanha dimensão pode trazer para o País.

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

O Coliseu Midiático

Com a imprensa alçando ao posto de celebridade a professora de educação infantil Jaqueline Carvalho dos Santos, 28, por sua perfomance "enfiada" e despudorada em casa noturna da velha soterópolis, não restam mais dúvidas. O Coliseu está de volta, mas agora com uma arena midiática, cuja audiência foi elevada a enésima potência, a priori via youtube e agora através do grande conglomerado empresarial de comunicação de massa.

Tanto na Roma antiga quanto hoje na Bahia de todos nós, o espetáculo da barbárie é o motor de atração de um bem valioso outrora e valiosíssimo agora: a atenção das pessoas. Antes, os olhos se voltavam para as sangrentas lutas entre gladiadores, ou mesmo para homens franzinos tentando fugir das garras de grandes leões. Em nossos tempos, a curiosidade está direcionada às sanguinolentas imagens do automassacre de excluídos do sistema de produção e circulação de capital, cultura e desenvolvimento social; ou para a depreciação da reserva moral em nome de uma visibilidade, a qualquer preço.

Diante de tal constatação, talvez ninguém possa deixar de considerar a linha de pensamento do escritor americano John Gray, autor de "Cachorros de Palha". Neste livro, Gray defende que do homo neandertal até o homo sapiens houve todo o tipo de evolução (econômica, social e tecnológica, sobretudo) menos aquela ligada à moral e à ética.

Não à toa, se na Roma antiga os reis e os nobres se divertiam com leões devorando plebeus, na Bahia de todos nós a grande massa de telespectadores não pisca os olhos diante de programas como "Se Liga Bocão" e "Na Mira", para ver a desgraça não de uma outra classe social mas dos seus vizinhos, amigos e parentes.

Interessados na vida cotidiana que os cerca, ali bem explorada nas telinhas pelos falsos jornalistas, esses pobres telespectadores enriquecem, com o próprio sangue, dor e sofrimento (no quer pode ser considerado espécie de sadomasoquismo social) os nobres da mídia com muitos pontos de Ibope a serem trocados por vultosos anúncios publicitários.

Para tal enfadonho cenário, a única saída é evitar ao máximo estar na platéia e principalmente no centro da arena de tão perigoso coliseu midiático.

sábado, 12 de setembro de 2009

Terror: Salvador sob ataques

Onze ônibus queimados, nove módulos policiais atacados, três policiais feridos e três viaturas danificadas. É o saldo triste de ações orquestradas por asseclas do narcotráfico em Salvador, sob ordens de seus líderes de dentro dos presídios. Em resposta, a polícia matou dez homens e prendeu 19 suspeitos de executarem os ataques. Tudo isso em apenas seis dias.

Como agravo, as últimas 24 horas, com uma sexta-feira, 11.9, fechando oito anos dos atentados às Torres Gêmeas em Nova York, foram pinceladas com tons de tensão, receio e apreensão. Circularam boatos de que uma bomba havia sido implantada em um shopping da cidade. Ontem, este blogueiro chegou a saber que um funcionário do gabinete do governador Wagner havia tido informações de que a Polícia Federal recebeu a denúncia do explosivo e equipes haviam se deslocado para invetisgar.

Por volta das 21h, houve movimentação anormal de policiais em frente ao shopping Itaigara. Mas tudo, felizmente, não passou de especulações, pelo menos até um segundo momento. Nos jornais, a ameaça de bomba não foi noticiada. E o A Tarde confirmou a falsidade das denúncias. Mas os boatos fizeram pessoas desistirem de ir ao shopping e ao jogo do Bahia. O clima de tensão também foi visto na reação dos rodoviários que ameaçaram recolher os ônibus nas garagens caso os ataques continuassem.

Os fatos e a repercussão deles na rotina dos soteropolitanos configuram uma cidade de reféns do que já pode ser chamado de terrorismo. A situação ganhou tamanha dimensão que já foi parar nas páginas de jornais internacionais como o El País. O diário espanhol registra que a Bahia está tomada pelo narcotráfico e pontua o assassinato de mais de mil civis só este ano e de 34 policiais militares no ano passado.

Cidade aclamada de forma desvirtuada pelo clima festeiro e "preguiçoso" de baías receptivas e provincianas abertas ao mundo, Salvador agora impressiona além fronteiras nacionais uma imagem de violência, aos moldes de uma antiga Bogotá, quando outrora dominada pelas guerrilhas. Pior que, diferente da distorção de tachá-la malemolente, a pecha de cidade do crime agora se cria com bases bem reais. O que aconteceu nesta semana nada mais é do que uma narcoguerrilha urbana com fortes tendências terroristas.

domingo, 26 de julho de 2009

O atendimento sem volta

Depois de passar a adotar uma máxima atribuída ao fundador da Wal-Mart, o empresário Sam Walton, comecei a ficar preocupado. Agora, sempre ao não me sentir bem atendido em uma loja, bar, restaurante, etc, não ponho nunca mais meus pés de volta no lugar. Era isso que supostamente Walton fazia para punir o mau atendimento. Muito coerente. A preocupação é que as opções estão a cada dia menores diante de tamanho "rigor" de consumidor.

O atendimento ao cliente em Salvador tem se mostrado tão ruim que às vezes beira o ridículo, porque desrespeitoso. Há alguns dias fui à livraria Siciliano, no shopping Iguatemi. Escolhi um livro e fui para o caixa pagar o produto. Como era um consumidor razoavelmente assíduo da livraria, contava com um cartão do programa de relacionamento da loja, pelo qual você soma pontos a cada compra e a partir de determinada pontuação pode ganhar descontos ou mesmo gratuidade em alguns livros.

Para meu espanto, a atendente informou-me que aquele cartão não tinha mais validade e que todos meus pontos de bônus haviam se perdido, pelo simples motivo de que a Siciliano havia sido comprada pela rede Saraiva. Pergunto-me ainda sem resposta: "Eu entro numa loja cujo nome no letreiro luminoso é Siciliano, cuja nota fiscal está em nome da Siciliano, e tenho um cartão da Siciliano invalidado porque agora ela não é mais Siciliano e sim Saraiva"?!! A gerente me disse que sim, infelizmente. Pronto. Fui para casa com o último livro comprado por mim naquela loja, onde jamais comprarei novamente.

Outro dia, fui devolver os filmes locados na GPW. Foram três CDs - um deles de bônus, porque a cada dois filmes você leva um terceiro de graça. Mas ele no final das contas me custou R$ 9,90, devido a uma multa por atraso na entrega. Tudo muito justo se o atendente tivesse informado que o maldito filme, do bônus, deveria ser entregue um dia antes, no caso um sábado, e não no domingo como os outros dois. Tanto não o fez como ainda enfatizou que a entrega seria no domingo. Tampouco chamou a atenção do cliente para observar os prazos de entrega na nota, dado que havia dois prazos e não apenas um.

Queixei-me ao gerente, sugerindo-lhe que nestes casos o atendente alertasse o cliente. Uma cortesia, gentileza que cativaria e não custaria nada. O gerente ironizou: "Vale a sugestão, mas da próxima vez sugiro que o senhor olhe as datas de entrega na nota". Bem, ainda não me decidi se voltarei a tal locadora.

Em outra feita... Não haverá espaço neste blog para tantas poucas e boas que já passei como consumidor. Por outro, sobrará espaço para listar os locais soteropolitanos que valem voltar a colocar os pés. Daqui para frente, vou anotar os nomes, e compartilhá-los.

sexta-feira, 3 de julho de 2009

Cláudia Leitte e o cerco da independência

No dia de comemorações aos 186 anos da Independência da Bahia, 2 de Julho, a cantora Cláudia Leitte fez uma homenagem às avessas. No Farol da Barra, por volta das 19h30 de ontem, estava montada uma megaestrutura, tudo a contento a uma grande festa comemorativa, que no entanto tornava-se inadequada por um simples e grande detalhe: o gramado do Farol estava fechado, virou um camarote destinado apenas a convidados, muitos deles integrantes do fã-clube da cantora.

É no mínimo curioso que em uma homenagem de independência, que devia estar atenta aos ideais de liberdade e justiça almejados naquela data história de 2 de Julho de 1823, sejam determinadas fronteiras, segregando o que deveria ser um público só. Claudinha Leitte ao privilegiar seus convidados acabou por tornar mais evidentes as diferenças de classe, estas ainda remanescentes em um Estado cujo processo real de independência ainda está em curso.

Foi triste ver se repetirem os modelos de festa tradicionais da capital baiana que insistem, com seus camorotes e espaços vips, em colocar a grande massa no segundo plano. Engraçado, é justamente o grande público que sustenta as vendagens de discos destes artistas ditos populares.

Em artigo recente na sua coluna na Folha de S. Paulo, o jornalista Gilberto Dimenstein chamou a atenção para o uso, embora legal, de verbas públicas por grandes nomes da música popular brasileira. Ivete Sangalo e Caetano Veloso, lembrou Gilberto, são uns que sempre se valem da Lei Rouanet para promover seus luxuosos espetáculos. Enquanto isso, artistas pequenos vão atrás de empresas privadas para patrocinar suas investidas.

Tudo isso é prova de que há uma inversão de valores em nome da sustentação de um mercado fonográfico. Nada contra. Nem mesmo contra os camorotes. O que não se pode perder de vista é que os espaços privados não podem se sobrepor aos públicos, do mesmo modo que os interesses particulares não podem aniquilar os coletivos, quiçá a liberdade do povo para ter garantido um lugar mais confortável no dia de comemorar sua luta de autoafirmação.

domingo, 28 de junho de 2009

A cultura não legitima atrocidades

Há quase uma semana, estava este blogueiro em Cruz das Almas, a 146 quilômetros de Salvador, cobrindo o São João da cidade, conhecida pela famosa guerra de espadas. Sempre ouvi dizer o quão perigosas são as batalhas de espadas, como elas resultam em feridos e mortos.

Felizmente não testemunhei mortes. Mas vi crianças, idosos, mulheres, homens e adolescentes queimados, machucados, mutilados. Um rapaz de 18 anos perdeu o olho direito. Um senhora de 63 anos teve traumatismo na mandíbula. Vi crianças de 13 anos sem luvas correndo atrás das espadas e uma delas teve o punho aberto em ferida por conta da brincadeira de mau gosto. Relatei tudo isso em reportagens pelo jornal A Tarde.

O motivo de voltar ao assunto aqui veio de comentários de alguns leitores sobre a minha matéria "Guerra de espadas deixa mais de 160 feridos em Cruz das Almas". Um leitor se identificando como Pedro considerou a reportagem "infeliz, só destacando o lado negativo". "A espada é uma manifestação do povo", argumentou. Outra leitora, de nome Luciana Fraga, condenou: "Muito infeliz a forma jornalística como foi conduzida esta reportagem, tendenciosa, preconceituosa..."

Engraçado, ergue-se a bandeira da tradição cultural para justificar fatos graves como crianças se ferindo e correndo risco de morte. O prezado Pedro esquece que nem sempre a decisão majoritária, e por assim dizer supostamente democrática, é dona da verdade (e lembremos que não se sabe se este é o caso de Cruz das Almas, já que nunca se realizou um plebiscito na cidade sobre o assunto). Além do mais, é princípio democrático que o desejo da maioria não elimine os direitos da minoria, sobretudo, quando falamos de direito à vida.

O perigo em validar atrocidades em nome da cultura é desprezar que acima dela existem os direitos humanos, que se referem à condição existencial primeira do homem, antes mesmo de sua formação cultural subsequente. O capricho cultural não pode irresponsavelmente aniquilar as premissas de liberdade, integridade moral, psíquica e física.

Infeliz não é minha matéria, infeliz é uma cultura querer se impor em detrimento da vida e do patrimônio público da cidade, onde a maioria da população e também visitantes não estão nas ruas soltando espadas mas sim em casa tentando se esconder delas. Infeliz é o argumento de que "à guerra vai quem quer", enquanto testemunha-se espadas que atingem inocentes, inclusive adentrando as residências.

Infeliz também é chamar de tendenciosa e preconceituosa uma reportagem que relatou fatos e não opiniões. Como não afirmar que a guerra quebrou barreiras jurídicas, administrativas e de bom senso, quando se testemunhou espadeiros "brincarem" em áreas proibidas pela prefeitura, perto de postos de gasolina, uma proibição que nem sequer podia existir, dado que ela lá existe pelo Código Penal. Cadê o bom senso em pais estimular seus filhos a soltar espadas, podendo se ferir gravemente? Cadê o bom senso em soltar espadas debaixo de carros, em postos de gasolina, em casas?

Se isso tudo pode se aceitar, tolerar e justificar em nome da cultura, o quê não se poderá então? Uma cultura sem limites como essa não pode ser nada mais que uma cultura tola, burra e cruel.

Adendo: Em reposta ao comentário da leitora Magali, é preciso esclarecer que este blogueiro não condena a priori a cultura da guerra de espadas, mas sim os argumentos de que por ser uma manifestação cultural estaria a guerra de imediato isenta de limites, mesmo em detrimento de direitos maiores do que a liberdade das expressões culturais. Concordo com a prezada leitora quando pontua a necessidade de se conscientizar a população para o respeito ao direito de ir e vir da população cruzalmense. Reafirmo, pois, a urgência de se estabelecer um plebiscito para que o povo daquela cidade decida sobre assunto tão polêmico e que as autoridades não se furtem da responsabilidade de punir criminosos que, em nome da cultura, põem em risco a integridade física de seus concidadãos.


foto: Eduardo Matins (Agência A Tarde)

sexta-feira, 26 de junho de 2009

Michael Jackson: o último show de um mito


A cada anúncio de um novo videoclip, a ser transmitido com exclusividade no Brasil pelo Fantástico, a expectativa em todos crescia como nunca e talvez jamais existirá novamente. Michael Jackson conseguiu como nenhum outro artista fazer da imagem um espetáculo acima dos recursos tecnológicos aplicados (incríveis, diga-se de passagem). Michael na tela, no videoclipe, era arte.

E daí porque sua natureza artística atemporal, impossível de ser vencida por uma reformatação da música pop, como afirmou o jornalista e crítico musical Hagamenon Brito no Correio da Bahia de hoje ao escrever que Michael não conseguiu se reinventar e ficou obsoleto. Não era mais preciso. Mitos não precisam se reinventar, porque pairam sobretudo como não mais existissem.

Nunca fui um conhecedor profundo de sua obra, nem fã. Mas não consigo esquecer do frisson ao acompanhar cada novo videoclip, e ficar estupefato pela performance. Michael Jackson foi talvez a última estrela a poder ser chamada de homem espetáculo e fazer de sua obra algo maior que sua própria existência como ser humano, que ontem saiu de cena (1958-2009).

quinta-feira, 18 de junho de 2009

Diploma: a ausência necessária

Por já ter me pronunciado antes sobre o assunto no texto "Contra o institucionalismo do diploma", serei muito breve quanto à decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), na última quarta-feira, de exitinguir a obrigatoriedade do diploma específico para exercer a profissão de jornalista.

É desperdício de energia dos meus pares fazer soar todo esse alarido de indignação frente à decisão. Primeiro porque o STF não impossibilitou que o diploma de jornalismo seja usado como critério de seleção. Ao contrário, reforçou este seu valor intrínseco, de garantia de conhecimento e não de mera promoção. Ou seja, o diploma fará a diferença se aquele que o possui refletir no exercício da profissão todo o saber certificado por aquele canudo debaixo do braço. Do contrário, denunciará com linhas mais fortes não ser merecedor do título que ostenta mediante um pedaço de papel.

Segundo, em sequência, estaremos tirando do mercado seu suposto viés estritamente mercadológico. Explico-me: se há uma gama maior de pessoas potencialmente jornalistas, nas empresas credíveis estarão trabalhando profissionais de excelência ainda maior dos que com hoje contamos, dado um processo mais competitivo de seleção. O mercado deverá ser mais exigente, porque a sociedade cobrará isso dele, já que será ainda mais a opinião pública, agora derrubado o diploma, a reguladora e fiscalizadora da qualidade dos registros jornalísticos.

E, por fim, o maior rigor do mercado deverá encontrar o melhor do jornalismo entre os diplomados, do contrário, tudo dentro das faculdades deverá ser revisto. E olhe só, está aí outra porta de retornos profícuos sendo aberta pelo diploma, ou melhor, por sua não obrigatoriedade.

quinta-feira, 21 de maio de 2009

A mijadinha está liberada

A causa ambiental é seríssima. Na verdade, é o grande engajamento político do século XXI, sobretudo para a juventude. O jovem que não está na onda verde é como, se comparado aos anos de chumbo da ditadura, estivesse alheio aos movimentos de esquerda, sem ter intimidadade com Marx, Hegel, e por aí vai.

Mas a obssessão pela conscientização das pessoas, delas terem o dever de zelar pelo meio-ambiente, às vezes de tão séria se torna tragicômica. Semana passada, a ong SOS Mata Atlântica divulgou uma campanha, com repercussão na mídia nacional, incentivando as pessoas a fazerem xixi quando debaixo do chuveiro.

Na verdade, eu achei ótimo e já votei (clique em campanha para votar) comunicando que sou mais um daqueles conscientes cidadãos que dão uma velha mijada no banho - os que mijam são 75% dos votantes por enquanto, os que não são 25%. Achei interessante a campanha porque deve ter sido, assim como o foi para mim, a milhares de pessoas, um grande incentivo para elas se livrarem de uma repressão infantil histórica. Cansei de ouvir, quando criança, minha mãe dizer: "o boxe está fedendo a mijo, quem foi que fez xixi no banheiro?". Ai de quem se declarasse réu confesso, o coro comia.

Fico aqui pensando... Minha mãe, muito menos eu, nunca imaginou que aquela mijada estava ecomizando 12 litros de água por dia, que seriam desperdiçadas pela latrina ao simples toque da descarga, gesto que a boa educação materna sempre encorajou a prática. Desde que li a campanha, dei várias mijadas durante o banho.

Isso é quase um milagre! É a primeira vez na história que o politicamente correto parece divertido e dá asas à perversão. Mas cá para nós. Não seria melhor fazer campanha a favor do controle de vazão da água a cada descarga dada, através de válvulas dispersoras de vazão, como já existe em alguns países?

Imagine se a cada vez que o sujeito tiver vontade de fazer um xixizinho, ele tiver que tomar um banho... Brincadeira! Mas que vai gerar paranóia, isso vai. Eu agora fico me pergutando se realmente dou descarga depois de fazer xixi, ou se vou em casa tomar um banho para largar a velha mijada e provar mais uma vez da delícia da subversão fisiológica em mim reprimida desde a infância!

quinta-feira, 23 de abril de 2009

Apolítica: da seca à chuva!

Os opostos chuva e seca são joio do mesmo trigo. Exercem sobre a humanidade consequências implacáveis, mitigadoras das mínimas condições de vivência de famílias, pobres, frise-se, pelo Brasil afora. São antípodas paradoxalmente de convergência natural, pela gênese fenomenológica que as provoca e pelo (sub) desenvolvimento sociopolítico que as retroalimenta em proporções agigantadas.

Quantas discussões sobre a transposição do Rio São Francisco, com posições a favor e contra, já foram realizadas, e não são de hoje, mas desde lá do Brasil Império, as notícias de projetos sobre o "Velho Chico" para acabar de uma vez por todas com o problema da seca nordestina, carrasca de milhares de vidas tupiniquins. Seguimos no século XXI com (ou será sem?) esta nuvem pesada sobre nossas cabeças.

Também não é de agora, que cidades metropolitanas sofrem em períodos chuvosos. Para se ater ao exemplo mais próximo, Salvador não dura debaixo de meros 10 minutos de chuva forte. Esgotos transbordam, casas desabam ribanceira abaixo, as ruas ficam alagadas, e o trânsito torna-se intrafegável.

Curioso é que, embora não se possa impedir a inevitabilidade natural dos dois fenômenos climáticos, suas consequências são bem mais fruto de uma apolítica irresponsável e acomodada do que resultado de um estado de mudança da natureza.

Ressalte-se que a prefeitura de Salvador não conseguiu cumprir ano passado o cronograma de obras das enconstas das áreas de risco de desabamento. Tampouco o governo municipal, e digo historicamente, foi capaz de engendrar um desenvolvimento social capaz de acolher um exôdo migratório interior-capital, com milhares de "novos soteropolitanos" chegando à capital e se amontoando sobre as encostas para consegui um lugar ao sol. Nem mesmo o Estado (Federal e estadual) foi capaz de evitar este êxodo, com políticas desenvolvimentistas descentralizadas, possíveis de reter a massa em suas cidades-natal com emprego e renda.

Outrossim, falhamos, a todo sempre, até agora, como sociedade, a ponto de exigir que a seca deixasse de ser usada em retóricas vazias eleitoreiras, contaminadas sempre de promessas de erradicação da "tragédia nordestina".

Portanto foi a apolítica miúda e ao mesmo tempo macro que elegimos como compasso de "evolução social", para agora ver, diante de nossos narizes, estes pilares fragéis ruírem secos e molhados, a mercê das intempéries do clima.

domingo, 12 de abril de 2009

Contra o institucionalismo do diploma

As discussões sobre a obrigatoriedade do diploma retornaram a todo vapor. Quem se diz a favor dela argumenta que se para outras profissões, como médico e advogado, é necessário o diploma porque ser diferente para se exercer o jornalismo. Quem se diz contra, vale-se da democracia e da liberdade de expressão para reforçar a natureza abrangente da profissão.

Bem, como jornalista e cidadão, preciso deixar claro que não sou contra o diploma, sou contra a sua obrigatoriedade, sobretudo se usada como reserva de mercado. Qualquer pessoa sensata nunca vai defender que a existência de uma instituição de disseminação de conhecimentos e técnicas para qualificação de determinada profissão não serve de nada, é inócua. Como também qualquer pessoa coerente, mesmo aquela que defende o diploma obrigatório, admite que a formação universitária não garante um bom profissional, um jornalista competente. Caso contrário, não teríamos jornalistas excepcionais sem diploma no mercado e péssimos profissionais com o canudo embaixo do braço.

Seria leviano afirmar que o médico, o jornalista, o advogado, o biólogo, o administrador, e por aí vai, prescindem de conhecimentos. Acho que ninguém discorda disso. O entrave de toda a discussão é então o lugar onde se adquire conhecimento. Partem daí as peculiaridades de cada profissão. As especificidades do médico tornam bem mais complicadas - não digo impossível - a qualquer um ser um profissional da saúde autodidata, ou a um químico, um físico, e por aí vai. Não esqueci do advogado, é que as possibilidades são maiores ao estudante autônomo de Direito formar uma bagagem que o credencie para exercer a profissão.

Evidente que não estou argumentando em favor de uma erradicação das instituições de ensino e, grosso modo, de controle de qualidade, estou me empenhando contra o institucionalismo do diploma em detrimento de pessoas altamente capacitadas a se tornarem jornalistas, por terem bagagem cultural, experiência de vida, ética, por conhecerem a história do País e por aí vai. Sem sombras de dúvida, tal bagagem aliada a um conhecimento mais profundo das engrenagens do processo comunicacional enriquece quem se candidata à profissão, o que em seis meses de vivência cotidiana dentro de uma redação permite facilmente. Vale lembrar que o jornal impresso mais conceituado do País, a Folha de São Paulo, aceita em seus programas de trainee pessoas de qualquer área do conhecimento, desde que com nível superior.

Um prova de que, muito mais do que ligado a um conhecimento acadêmico, o jornalismo está relacionado a uma pragmática; não pode ser exercido aos moldes do conhecimento científico, tal a medicina, a química, a antropologia, etc, pois está no campo da intersubjetividade, onde interagem técnica (adquirida com a práxis) e sensibilidade (adquirida com a vida).

sábado, 4 de abril de 2009

Rubinho prega peça na história

Aprendi na escola com "n" professores que a história da humanidade é aquela dos vencedores. Claro! Primeiro, quem lança mão da pena histórica é quem chegou ao poder para usá-la. Segundo, ninguém se empolga com exemplos de fracassados. Pelo menos é o que se cogitava até Rubens Barrichello, nosso Rubinho, entrar para o pomposo circuito da Fórmula 1 como revelação e estar à beira da aposentadoria como, pasme, uma promessa.

Taí, Rubinho entrou para história como uma grande promessa de campeão, o possível sucessor de Senna. Chegou na equipe Jordan ainda novo, aos vinte e poucos anos. Correu uma, duas temporadas e nada de título. Que besteira, pensava o público brasileiro, ele ainda é novo, está pegando experiência, quando for para um carro veloz, o título virá. Chegou na Ferrari, e ainda me lembro de Galvão Bueno anunciando a contratação como quem grita um gol do Brasil em final de Copa.

Os anos se passaram e Schumacher fez de nosso Rubinho, aquela promessa, um eterno segundo lugar. Que besteira, ponderou o público brasileiro, ele não pode competir de igual para igual, não pode vencer, porque o contrato o impede. E ficou-se satisfeito com o vice-campeonato, com nossa revelação já esbranquiçando os ralos cabelos, depois de tantas frustações, motores quebrados, falta de combustível a poucos metros de cruzar a linha de chegada na primeira posição, entre outras surpresas, às quais atribuímos motivações sobrenaturais. "Ele é um bom piloto, mas é azarado, coitado!", cansaram de dizer aqueles espectadores mais otimistas.

Agora, aos 36 anos, ostentando o título de piloto mais experiente da história (com 259 grandes prêmios, 9 vitórias e dois vice-campeonatos), o paulista Rubinho viu apontar neste início de temporada talvez sua última chance de subir ao pódio mais alto da Fórmula 1. A sua atual equipe, a Brawn GP, tem até agora os melhores carros. Esperava-se que os longos anos de Barrichello nas pistas, somados a um carro rápido, sem Schumacher, o levassem naturalmente à posição de favorito, e foi assim que brotou uma nova esperança.

Nada que o famoso "azar" de Rubinho não destruísse em dois GPs. Na Austrália ficou atrás do companheiro Jenson Button. Por ironia, chegou em segundo, posição na qual largou, com um golpe de sorte. Na Malásia, viu Button ganhar mais uma e cruzou a linha de chegada em quinto, um bom lugar, se considerarmos que ele largou em nono, por ter sido punido em quatro posições, em função de ter trocado a caixa de marchas - pelas novas regras, isso só poder ser feito depois de duas corridas.

Advertidamente, foi Rubinho quem pregou uma peça na história e não o contrário. Quando a história, na sua contigência, fornece todos os subsídios para tornar a promessa enfim num grande campeão, Barrichelo se ocupa de lembrá-la que seu lugar já foi marcado históricamente: o de eterno segundo lugar, e é assim que ele a registrará, sem omissões. Pela primeira vez, um perdedor tomou a pena na mão, ou, tomara, eu queimarei minha língua, porque, por incrível que pareça, torço para nosso "pé de chinelo" chegar finalmente à grande glória de campeão.

quarta-feira, 25 de março de 2009

Da janela de um avião, sonhei...

Mirando de um pequeno vão quase oval, a 38 mil pés da face terrestre, eu era um marinheiro, quer dizer, tripulante de primeira viagem, cujos 27 anos foram suavizados num comportamento infantil, pelo encantamento que a vista celeste me causou. Só tinha viajado de avião ainda bebê, por isso ignorava as benesses desta invenção brasileira fabulosa! Deus abençoe Santos Dumont!

Apertei-me ainda mais naquela pequena poltrona, e segurei firme as mãos de minha namorada (com quem eu tive a honra e o prazer de compartilhar tamanha experiência), quando aquela máquina espetacular arrancou literalmente "avionada" para instantes depois alçar voo. Passado o susto, grudei a cara na janelinha quase oval e adentrei um mundo de fantasias, foi essa exatamente a descrição imediata que fiz ao olhar àquela imagem de Google Earth superreal. Minha vontade era transgredir os limites, trascender da minha condição corpórea e sair flutuando entre as nuvens tal qual um Peter Pan extratosférico. E quem sabe encontrar anjos tocando arpas, sentados sobre as nuvens, tal como Véu, minha namorada, brincou.

De volta à terra, a cada vez que um avião risca o céu, sinto-me convocado a sonhar. Voar de avião é uma extraordinária aventura que o homem banalizou ao torná-la ação diária e utilitária. Foi uma das coisas que o jornalista Alexandre Garcia quis dizer no texto Sentar-se à janela (que Mil, um amigo, me passou via email): "Cresci, me formei, e comecei a trabalhar. No meu trabalho, desde o início, voar era uma necessidade constante... Perdi o encanto. Pensava somente em chegar e sair, me acomodar rápido e sair rápido". Alexandre inscita a todos a sentar na janela da vida para não perder seus encantos.



Grande conselho! Da janela do avião, acredite, podemos nos distanciar da marcação temporal cruel e rigorosa de nossas vidas. Uma oportuniade imperdível de contemplá-la. E como é muito paradoxal isso! Porque a invenção avião é daquelas que cansamos de ouvir serem chamadas de coisas dos tempos modernos, que permitem a compressão do tempo e espaço. Viagens que durariam dias são realizadas em horas. E quantas vezes não nos pegamos correndo desesperados para não perder o voo. Mas, taí. Dentro do avião, criação do homem, sentimos a mão forte de Deus pairando sobre nossas cabeças. A imensidão azul, o tapete branco de nuvens, os rios serpentiando as terras verdes... Sempre admirei o céu, espiando-o daqui de baixo. Não imaginava que o aqui embaixo fosse tão fabuloso lá de cima.
fotos: George Brito

quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

Aos bancos, estes cínicos

No lançamento da delegacia móvel e do novo sistema de telecomunicação digital da polícia baiana anteontem, o governador da Bahia Jaques Wagner fez um discurso forte e inflamado: "há uma certa hipocrisia hoje no mundo. Nós ficamos aqui tentando resolver na distribuição (de armas) quando todo mundo sabe que o problema está na produção". A frase destaca-se de um discurso que criticou veementemente o modelo capitalista, o qual o ex-sindicalista tachou de "cassino financeiro".

Aplaudo a ênfase verbal do governador, embora possa parecer ingenuamente ideológica. O cinismo do capitalismo permite por exemplo à Federação Nacional dos Bancos (Febraban) tentar justificar, sob o argumento de uma inadimplência alta, o absurdo spread (diferença entre o que paga os bancos para captar dinheiro e aquilo que cobram para emprestá-lo) que adota o sistema bancário brasileiro, isso porque opera com juros reais de 43,2%, média anual. Ou seja, em nenhum outro País do mundo é tão lucrativo ser um "agiota institucionalizado".

Não à toa o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, culpabilizou os bancos pelos juros altos brasileiros. Com toda razão. Nada adianta baixar a Selic, se os agiotas não deixam de cobrar caro para emprestar dinheiro ao consumidor. Muito cinismo dizer que a alta da inadimplência obriga juros altos, e o contrário, cara pálida, não parece mais razoável?

Bem, governador, no Brasil há uma certa hipocrisia. Quando os discursos exaltados socialistas apontam os bancos como o "mal maior do sistema capitalista" logo de prontidão existe uma legião de liberalistas econômicos, esses mesmos que ainda se arvoram nas premissas de Paul Krugmam ou Adam Smith, para subjulgar de radicalismo ingênuo e obsoleto as fabulações ditas de extrema esquerda.

Jamais negarei que cheguei a me inclinar a tal pensamento, mas cai em mim ao perceber que o mundo está de "ponta a cabeça", com as esquerdas de todas as origens - racial, proletária, sexual, ideológica - chegando ao topo da pirâmide política. Tem uma nova ordem mundial se apresentando, sinal de que é hora de caírem as máscaras.

quinta-feira, 15 de janeiro de 2009

A estupidez do povo israelense

Os milhares de palestinos mortos pelos ataques israelenses à Faixa de Gaza anunciam um massacre, não um combate. Quem tentar dizer o contrário, faça bem longe de mim. Por isso, o apoio do povo de Israel à esmagadora ofensiva do exército do ministro de Defesa, Ehud Barak, é um dado preocupante. Quando a sociedade sustenta a violência capiteanada pelo Estado armado tem-se a morte da democracia e dos Direiros Humanos, e líderes autocráticos, populistas e belicistas com altos índice de popularidade revelam um grau mínimo e perigoso de civilidade de uma nação.

Se o povo de Israel apoia o massacre não é, como defenderia alguns, porque ele sente na pele os efeitos trágicos dos foguetes lançados pelo Hamas, senão seria muito mais razoável defender o acordo de paz. Ele motiva o massacre porque tem incrustado em sua cultura narcisista que é um povo superior aos palestinos e, de fato, deve ser soberano em detrimento de um Estado palestino. A mesma estupidez acometeu os yanques quando do ataque dos Estados Unidos ao Afeganistão e ao Iraque - George Bush, em um primeiro momento, foi apoiado pelo povo americano e teve ali seus melhores índices de popularidade.

Pela atrocidade cometida, Bush deveria sofrer impeachment e ser banido da política, do mesmo modo que o aplaudido Barak hoje. Os dois são exemplo de que aquele velho adendo continua valendo como nunca: o povo tem o líder que merece.

O trabalhador paga a conta

Ao abrir os jornais locais nesta manhã, deparo-me com a perspectiva dos empresários baianos e paulistas - Fieb e Fiesp - de reduzir a jornada de trabalho e realizar cortes nos salários dos trabalhadores, como uma das medidas de um pacote de solução para enfrentar a crise econômica e evitar um "mal maior".

Não sou dos melhores entendedores de política econômica, pelo contrário, mas fico aqui com meus botões: este corte vai ser baseado em que critérios, porque a redução do poder aquisitivo dos trabalhadores não pode colaborar para um mais rápido desaquecimento do mercado consumidor interno, este que segurou as pontas do Brasil, quando todos os outros países viam suas divisas irem pelo ralo?

Vejo o presidente Lula a todo momento instigando os brasileiros a comprarem e provocando os empresários a não serem covardes e apostarem, com criatividade. E nada menos que o economista Delfim Neto disse que Lula é "o maior economista do País". Na contramão deste otimismo - benéfico porque qualquer um sabe que o famigerado mercado financeiro, dito autorregulável (escrita à luz do novo acordo ortográfico) tem como um dos seus pilares o quesito subjetivo da confiança - os empresários já bateram pé firme e não vão considerar a contrapartida de manutenção dos postos de trabalho em troca das ações do Governo que beneficiaram as empresas neste momento de crise, como a desoneração de impostos e o aumento das linhas de crédito oferecidas pelo Banco do Brasil, Caixa e Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social.

Isso soa curioso. Lembremos que a redução da jornada de trabalho versus cortes de salários e benefícios é um das oposições cruciais da tão arrastada reforma trabalhista. Muito longe de ser um fator sazonal, este impasse é inerente ao modelo desenvolvimentista, este que por comodidade ou conveniência intelectual não se coloca em questionamento. A economia tem sempre a obrigação de gerar mais empregos, que se traduz em força de produção, pouco importa a que preço para o proletário - seja ele cognitivo ou ainda braçal.

Fico aqui visualizando milhares de trabalhadores cumprindo um expediente de seis, cinco, ou quatro horas , e ganhando, sei lá, 30% ou 40% menos. Estes asseclas do capitalismo vão ter que procurar um segundo emprego para manter sua vida, enquanto outros milhares vão se degladiar para conseguir ocupar as vagas deixadas pelos outros. Ou seja, um grande carrossel de desesperados girando à procura de um impulso econômico mentiroso. Enquanto isso um discurso chifrim tenta convencê-los que a redução do custo trabalhista às empresas é indispensável para o desenvolvimento do País. E a desoneração dos impostos, caras pálidas, não adianta de nada?

Frente a tal postura e ao cenário econômico atual minha conclusão é triste e para muitos superficial, porque pode parecer chavão dos guetos socialistas. A "aldeia global" capitalista move-se pela lógica da opressão às classes produtivas de base, embora esconda-se sob um discurso de desenvolvimento sustentável e de Estado de Bem Estar Social. A crise do mercado financeiro deixa isso bem claro e trouxe um lição: quando o Titanic capitalista começa a afundar, os botes salva-vidas são destinados aos donos dos dólares e as portas são fechadas para a plebe proletária. E quando as ondas do naufrágio chegarem às costas brasileiras, os empresários puxarão a prancha dos trabalhadores e deixarão a eles a conta da lancha.

quinta-feira, 1 de janeiro de 2009

A grande sacada da virada do ano


Desde de novembro não escrevo uma linha sequer neste espaço que se pretende uma janela para minhas idéias. A vida de jornalista é uma obstinação da escrita tão grande que não se tem mais vontade de escrever depois de dias a fio "batendo" matérias. O primeiro dia do novo ano então chamou-me de volta. Por que fico aqui pensando com meus botões o que de fato significa esse amanhecer de mais um dia, considerado a grande virada.

Inteligente e sensível, o escritor Mário Traquina disse que o Ano Novo é talvez a invenção mais feliz do homem. É o tempo certo para investirmos toda nossa energia em torno dos nossos sonhos e metas e quando esgotados, vem a renovação das espectativas através da grande virada do ano. Por isso, desejamo-nos votos de prosperidade e felicidade.

Concordo com Traquina. Em termos de pragmatismo, o calendário tem lá sua importância para a vida dos homens, sobretudo no que tange às relações formais. Mas, em suma, o grande lance é o ganho psicológico. O importante de virar o ano é abraçar as pessoas e simbolicamente compartilhar de um mesmo desejar, que estamos caminhando para algo bom e especial que está guardado em algum lugarzinho e momento do futuro. É como iludir-se de que a transformação começa ao raiar do primeiro sol do ano.

Não sei se algum de meus poucos leitores já tentou guardar as imagens dos rostos das pessoas no momento que rompe o ano novo. O que visualizo, como em um pequeno filme curta metragem na minha cabeça, são pessoas sorrindo umas para outras, olhos de cumplicidade mirando-se reciprocamente, para depois, no ápice, abraçarem-se e logo em seguida desejar algo bom ao pé do ouvido da namorada, do namorado, do amigo, do irmão, da mãe, do pai, do avô e por aí vai.

Essa é a grande mágica da virada. Naquele instante, à parte o preço da Champangne, o glamour da praia, o valor do 13º salário, a cor a constratar com as vestes brancas, a humanidade vibra a uma só nota, como em um grande acorde harmônico. E daí a força deste momento.