sexta-feira, 5 de março de 2010

Cotas: "Não é questão pessoal, é de toda a sociedade"


Terminam hoje as audiências públicas no Supremo Tribunal Federal sobre a constitucionalidade do sistema de cotas. As discussões foram abertas depois de chegar à Suprema Corte duas ações direta de insconstitucionalidade (Adin) contra a reserva de vagas.

Conforme informações do jornal Estado de S. Paulo, em uma delas o DEM questiona os critérios raciais utilizados desde 2004 pela Universidade de Brasília (UnB) para a admissão de estudantes pelo sistema de cotas. A outra foi apresentada por um estudante que se sentiu prejudicado pelo mesmo sistema adotado na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

É um Dia D para milhares de brasileiros por esse País afora. Só na Bahia, são mais de 20 mil cotistas, somados os alunos da Universidade Federal da Bahia (UFBa) e da Universidade do Estado da Bahia (Uneb). Isso porque se o STF julgar as Adins procedentes estará estendendo a decisão para todos os demais casos, resultando na extinção do sistema de cotas no Brasil.

A iminência de uma decisão tão vital me fez pensar na pedagoga que conheci ainda essa semana. Ela foi aluna da primeira turma de cotistas da UFBa, formou-se ano passado e hoje trabalha na coordenação pedagógica do Centro de Estudo Afro-Orientais da universidade, além de ensinar, em uma ONG, a meninas negras do ensino fundamental.

Diante de agurmentos pró e contra - por um lado de que o sistema de cotas é racista, e que de outro é emergencial enquanto não se qualifica nosso ensino médio e fundamental - as palavras dela foram iluminadoras. "Acho que as pessoas têm que se colocar no histórico de exclusão do Brasil. Elas devem execer seu papel de cidadão, de contribuir para diminuir a desigualdade. Não é uma questão pessoal, mas de toda a sociedade", disse.

Defendia, é claro, sua própria causa. Mas tomando-a como base, cabe a nós refletir sobre a nossa responsabilidade frente ao nosso legado histórico nas dimensões social, econômical e cultural. Vejo com frequência alunos que não conseguiram ingressar em uma universidade pública devido à reserva de vagas argumentarem que não podem pagar pela dívida histórica brasileira.

Olhando bem, é um pensamento extremamente elitista. De que a ordem socioeconômica em marcha nos últimos séculos, do mercantilismo incipiente à sua forma brutal neoliberalista, os colocou em posição de vantagem no processo de acumulação de riquezas, em consequência de aquisição dos materiais simbólicos. E isso, pensam os ingênuos jovens ricos e, na maioria, brancos, não pode ser  lhes retirado pelo mesmo Estado que os alçou a tal privilegiada posição.

Não vi e não vejo levantes das classes privilegiadas para exigir do Estado a melhora substancial da rede de ensino público brasileiro. Os alaridos só se fazem ouvir quando as políticas públicas atingem em cheio as benesses das elites. Concordo que devemos querer sim o fim do sistema de cotas, mas essa batalha não dever ser anterior à luta pelo resgate das escolas públicas. Que tal começarmos por matricular nossos filhos (futuros e existentes) na rede pública e fazer valer o peso de nosso poder aquisitivo em prol desse propósito?  


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