Está na parede do escrutínio jurídico o grau de civilização da sociedade brasileira, em termos sociais, morais e científicos. Esta primeira semana de março de 2008 já é sem dúvida histórica, independente da decisão que vá tomar os 11 ministros do Supremo Tribunal Federal sobre a constitucionalidade do artigo 5º da lei de biossegurança de 2005 que aprovou o uso de células-tronco embrionárias para fins terapêuticos, com as condições de que tais células já tenham sido descartadas para fins reprodutivos e estejam congeladas há pelo menos três anos.
Com bem disse Arnaldo Jabor, no seu comentário de ontem à noite no Jornal da Globo, é uma oportunidade ímpar do poder Judiciário de contribuir sobremaneira para um sentido civilizatório a uma sociedade ainda mergulhada em boa parte na ignorância e na incultura, principalmente científica. Do comentário do cineasta, entende-se uma convocação extra-oficial ao STF a votar com a razão de uma evolução técnica e não sob à luz de critérios moralistas, ainda que estes possam ser minimamente invocados pela Carta Magna, ou ainda, por um apelo popular de um país predominantemente católico.
Em reforço ao texto de Jabor, pode-se registrar que, na sua conotação já histórica, o julgamento em si mesmo já é evidência de que a sociedade brasileira ainda está muito longe de vê fortalecida a tal modernidade democrática pela consciência popular, da nação, do bom senso do povo. Prova maior disso, é que assuntos de tal magnitude, e de importância inquestionável quanto têm as pesquisas com células-tronco embrionárias, ainda se vêm sujeitos a um tecnicismo jurídico de 11 homens a falar em nome do conceito de vida, para deliberar sobre matéria que uma vez aprovada vai beneficiar milhares de seres humanos.
Os contrários à liberação, a exemplo do ex-procurador-geral da República, Cláudio Fonteles, autor da ação de inconstitucionalidade, arvoram-se em prol da vida, sob a égide de uma moral católica e suspostamente humanitária, que, como paradoxo, declina em seu viés moral toda vez que suscita a defesa à vida, para fortalecer o argumento. A resposta crua vem nas palavras do advogado-geral da União, José Antônio Dias Tofolli, que usou os mesmos argumentos das pessoas contrárias aos tratamentos com células-tronco embrionárias para defender a continuidade da pesquisa. "O princípio é o mesmo, de defesa da vida humana", declarou há pouco em audiência do STF.
O momento histórico revela uma civilidade em xeque, quando se recorre à Justiça para mostrar que caminhos uma sociedade deve seguir para preservar a vida. Seria proporcional levar ao Supremo à responsabilidade de julgar se é certo ou errado roubar e matar. Neste caso, a escolha parece tão óbvia, sem necessidade de moralimos tecnicistas que dêem à questão uma complexidade que não é real. O mesmo poderia ser dito das células-tronco embrionárias.
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